terça-feira, 17 de março de 2009

SOLI DEO GLORIA – O Caminho da Vida


“... Amavam mais a glória dos homens do que a glória de Deus” (Jo 12.43)


Introdução


Soli Deo Gloria! O dístico da Reforma Protestante mais esquecido em nossos dias. Não quero dizer que os outros (Sola Scriptura, Sola Fide, Sola Gratia e Solus Christus) não sejam também esquecidos. Embora todos estejam unidos, a Glória de Deus é a mais rejeitada por causa da própria natureza humana. E por que isto? Porque os outros dísticos podem sem usados ou deturpados para glória do Homem e não para a Glória de Deus.



Glorificar a Deus é o fim principal do Homem e isto em todas as áreas de sua vida. Quando isto não acontece, então a Glória de Deus é roubada. E, não tenho dúvidas, de que desde muito tempo há uma erosão nesta doutrina tão defendida pelos Reformadores: “o mais importante propósito da vida humana é glorificar a Deus”(VOS, 2007, p. 32). É ter “negócios com Deus”, como diria João Calvino, pois a “existência humana é vivida Coram Deo[1], ‘diante de Deus’ ou ‘na presença de Deus’”(GEORGE, 1994, p. 60).

O Antropocentrismo, isto é, a “crença que atribui ao ser humano uma posição de centralidade em relação a todo o universo, seja como um eixo ou núcleo em torno do qual estão situadas espacialmente todas as coisas (cosmologia aristotélica e cristã medieval), seja como uma finalidade última, um télos que atrai para si todo o movimento da realidade (teleologia hegeliana)”(adaptado HOUAISS, 2005), é a forma que está em ação e em evidência em nossos dias, como nunca dantes.

Nosso objetivo com este texto é apresentar uma visão bíblica para uma vida teo-referente, ou seja, uma vida que tenha a Deus como referência suprema em todas as áreas do viver, fundamentada nas palavras paulinas: “quer comais quer bebais, ou façais outra qualquer coisa, fazei tudo para glória de Deus”(1 Co 10.31), de modo que venhamos mais a amar a glória de Deus do que a glória dos homens.

Glória de Deus

Definindo biblicamente a expressão “glória de Deus”, comecemos pelo Antigo Testamento. O termo comum para “glória” é dwbk (kabod) cujo sentido inicial é “ser pesado”, mas que figuradamente expressa alguém “de peso” na sociedade, “alguém que é honrado, marcante, digno de respeito”(DITAT, 1998, p. 695). No sentido negativo pode significar “severidade” (Ex 5.9; 1 Re 12.10), tal como aplicado ao pecado de alguém (Is 1.4; Pv 27.3). Já no uso positivo, é a reputação de alguém que está em vista (Nm 22.15). Neste sentido implica em honra, respeito, atenção e obediência (idem, p. 697). Porém, é em referência a Deus que o termo dwbk assume o mais incomum e peculiar sentido. A princípio é uma manifestação visível de Deus, uma auto-revelação de Deus associada à sua santidade; segundo, é a vontade de que os Homens conheçam a Sua realidade e esplendor (idem, p. 697), cujo impacto leva o Homem a fé e obediência, tendo o seu caráter moldado pelo assombro de Deus! É isto que aconteceu na Encarnação de Jesus Cristo (Jo 1. 14; 17. 1 – 5). É Cristo Jesus, por isso mesmo, chamado “Senhor da Glória” (1 Co 2.8; Tg 2.1) – no AT Yahweh é chamado “Rei da Glória”(Sl 24. 9, 10). É o não reconhecimento da presença divina ou transferência da honra devida ao Senhor Deus que constitui idolatria. Reconhecer as suas obras (Ex 14. 7 – 18; Sl 19.1; 96.3)
No Novo Testamento não é diferente. Segue, no geral, o AT, e quando aplicados ao Senhor Deus, indica honra(Lc 17.18; At 12.23), significando, à luz do mundo porvir, a realidade ou modo de existência escatológico(DITNT, 2000a, p. 902). Desta forma, aquilo que o Homem fizer deve ser para a honra de Deus ou deve lhe promover a fama e reputação (Mt 5.16; Rm 1.21; 1 Co 6.20; 10. 31).
Assim, a ênfase das Escrituras, e refletida na Teologia Reformada, é a doutrina de Deus. A Teologia Reformada começa e termina com Deus, é Teocêntrica, “acentuando a plena soberania de Deus em todas as coisas – na criação, na providência e acima de tudo na redenção. B.B. Warfield e C. Van Til referem-se a isso como uma atitude religiosa específica que se expressa numa profunda apreensão de Deus em sua majestade”(MATOS).


Nas palavras do Teólogo B. B. Warfield:

Repousa sobre uma profunda apreensão de Deus em Sua majestade, com a inevitável e estimulante realização da exata natureza da relação que Ele sustenta na criação como ela é, e em particular, na criatura pecadora. Aquele que crê em Deus sem reservas, está determinado a deixar que Deus seja Deus em todos os seus pensamentos, sentimentos e volições - em inteiro compasso das suas atividades vitais, intelectuais, morais e espirituais, através de suas relações pessoais, sociais e religiosas”.


Esta visão majestática permeia nossa fé cristã e presbiteriana. O Reformador João Calvino (2002, p. 61) fala sobre isso dizendo:

Em primeiro lugar, para onde quer que voltemos os olhos, não há o mais diminuto rincão do mundo em que não refulja ao menos alguma centelha da glória de Deus. Realmente, ninguém pode de um relance contemplar a belíssima obra de arte universal em sua vasta amplitude e extensão, sem ficar, por assim dizer, estupefato ante a incomensurável riqueza do seu esplendor

O nosso Catecismo Maior de Westminster inicia com a seguinte pergunta: Qual é o fim supremo e principal do homem? A Resposta é dada nas seguintes palavras: O fim supremo e principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre. Neste ponto, confirmado desde Gn 1. 1 – no princípio criou Deus os céus e a terra – vendo Deus toda a Sua Criação como boa (Gn 1.31), a “glória de Deus e seus propósitos no mundo são mais importantes do que a salvação da alma de alguém”(LEITH, 1999, p. 111)(Cf Is 40. 10, 12, 17). Dito em outras palavras, glorificar a Deus, pela obediência, é em primeiro lugar. Permita-me citar as palavras do Apóstolo Paulo: “Porque dele e por ele, e para ele, são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém”(Rm 11. 36).

Johannes Gerhard Vos (2007, p. 32), sumariamente afirma, apresentando uma teologia fortemente bíblica:

O componente mais importante do propósito da vida humana, portanto, é glorificar a Deus, ao passo que gozar a Deus está estritamente subordinado ao glorificar a Deus. Na nossa vida religiosa deveríamos colocar sempre a ênfase maior no glorificar a Deus. Quem assim o faz irá gozar a Deus em verdade, tanto aqui quanto no porvir. Mas quem pensa que pode gozar a Deus sem O glorificar corre o risco de supor que Deus existe para o homem, e não o homem para Deus. Enfatizar o gozar a Deus mais do que o glorificar a Deus resultará num tipo de religião falsamente mística ou emocional

O Roubo da Glória de Deus




A busca pela Centralidade do Homem no Universo é vista desde o Éden, quando nossos primeiros Pais pecaram. Diz o relato dos três primeiros capítulos de Gênesis que Deus, deliberadamente (façamos....)[2] , criou o Homem, macho e fêmea, para que fossem Seu vice-regentes, para que governassem o Mundo como “coroa da criação” divina. Nas palavras do Salmista, a Criação por si só já refletiria a glória de Deus (Sl 19.1; Sl 8. 3). Apenas a contemplação “dos teus céus, obra dos teus dedos, a lua e as estrelas que preparaste”, gera a pergunta: “Que é o homem mortal para que te lembres dele? e o filho do homem, para que o visites?”(Sl 8.3, 4). No entanto, por condescendência de sua parte, aprouve a Deus também criar o Homem para a Sua própria glória. O Salmista diz que o próprio Deus revestiu o Homem de honra e de glória (Sl 8. 5-8). Assim, o Homem foi criado para a glória de Deus (Cf. Is 43.7), sendo o Senhor Deus a referência para esta glória, ou em outras palavras, a glória do Homem seria manifestar a Glória de Deus; este seria o significado e o propósito do Homem: viver para a glória de Deus.

Mas no Éden algo aconteceu com o Primeiro Casal. No instante que a Antiga Serpente, Satanás, ofereceu a Eva o fruto proibido, houve uma mudança na referência: De Deus, o Criador, para o Homem, a Criatura. Há, no Éden, uma busca da própria glória. A mudança referencial, isto é, o Homem buscar o significado de sua vida na própria Criação, é o “roubo da glória de Deus”. Não há como ter sentido na Vida na busca do finito e temporal. Por isso que o Naturalismo e o Humanismo não proveem razão e esperança, mas provoca desespero. Nossos primeiros Pais trocaram a glória eterna de Deus pela glória transitória do Mundo. Buscaram a felicidade por conta própria, embora já estivessem no Jardim do Éden (prazer, felicidade, alegria).
No estado atual, é este o conflito do Ser Humano: Como encontrar sentido no que faz. Por exemplo, Salomão diz que a vida do Homem é um constante repetir (Ec 1), trabalhar e gozar do fruto de seu trabalho (Ec 2), mas tudo isto, sem ter o fim principal (Ec 12.13), é “correr atrás do vento”, “aflição de espírito” (Ec 2.11).
Esta visão da glória de Deus é, portanto, extensiva a todas as áreas da vida. Como diria Abraham Kuyper, “não há uma só polegada da Criação que Cristo não diga ‘é meu’”. O livro “Reforma Hoje”(1999) traz o seguinte comentário:

E foi devido a esse conceito de que vivemos para Deus e de que para ele devemos fazer o melhor que a Reforma contribuiu para uma grande revolução não só no campo religioso, mas no mundo das artes, da ciência e da cultura em geral. Soli Deo Gloria passou a ser o lema não só de reformadores, mas de músicos (como Bach), pintores (como Rembrandt) e escritores (como Milton), que apunham às suas obras esta expressiva dedicatória” (BOICE et all, 1999, 124).

Conclusão

A glória de Deus deveria ser a ambição do Ser Humano, e em especial do Cristão. Mas o que vemos? O próprio Cristianismo tem mudado a glória de Deus, por secularizar-se e abraçar uma cosmovisão pagã.
No começo falei que o Soli Deo Gloria é o tema mais negligenciado entre os chamados evangélicos. Como isto se dá? Ora, sempre que os outros Sola’s são desprezados.

1) Quando da Fé (Sola Fide) fazemos uma obra humana ou “um botão de liga-desliga” a Deus e com ela barganhamos com o Senhor. Ainda quando fazemos da Fé o dispositivo que nos faça “mover no sobrenatural” e não “o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem”, pela qual pode-se alcançar testemunho como os dos antigos e por ela entendermos a Criação e agradar a Deus (Hb 11. 1 – 3).

2) Quando barateamos a Graça (Sola Gratia) e em nome da mesma usamos de pretexto para dar ocasião à carne (Gl 5.13). Como pergunta o Apóstolo Paulo: “pecaremos porque não estamos debaixo da lei, mas debaixo da graça? De modo nenhum!”(Rm 6. 15). Santificação é que tem faltado entre o Evangelicalismo Moderno. Fazemos da Graça de Deus a desculpa para pecarmos.

3) Quando fazemos de Cristo Jesus o “cara lá de cima”. Isto não é coisa só de não-cristãos, mas daqueles que se dizem Cristãos. Jesus Cristo há muito que deixou de ser o nosso modelo, a quem devemos imitar. Ele é o brother com quem tratamos de igual para igual. Não é mais o único Mediador (2 Tm 2.5). Em seu lugar colocamos “novos sacerdotes”, “apóstolos” e “bispos” que nos aproximam de Deus. É lastimável ver entre nós que Jesus Cristo não passa de “operador de milagres” e terapeuta! Onde está o Deus-Homem(Theanthropos)?

4) Quando fazemos das Escrituras, a Palavra infalível de Deus, o “amuleto religioso”; quando deixamos de lado as Escrituras para fundamentar nossos ensinos em supostas “novas revelações do Espírito” ou, pior, em nossos desejos carnais e malignos. Agimos dizendo: “se as Escrituras não dizem nada, então eu posso fazer!”
Por vezes pensamos que Deus nos deu a Sua Palavra apenas para servir de parâmetro religioso. Como Reformados, já nos esquecemos que “Todo o conselho de Deus concernente a todas as coisas necessárias para a glória dele e para a salvação, fé e vida do homem, ou é expressamente declarado na Escritura ou pode ser lógica e claramente deduzido dela. À Escritura nada se acrescentará em tempo algum, nem por novas revelações do Espírito, nem por tradições dos homens; reconhecemos, entretanto, ser necessária a íntima iluminação do Espírito de Deus para a salvadora compreensão das coisas reveladas na palavra, e que há algumas circunstâncias, quanto ao culto de Deus e ao governo da Igreja, comum às ações e sociedades humanas, as quais têm de ser ordenadas pela luz da natureza e pela prudência cristã, segundo as regras gerais da palavra, que sempre devem ser observadas".(CFW, I, 6).

Esquecemo-nos que, sendo Deus Soberano, a Sua Palavra não ensina primeiramente como devemos ser felizes ou prósperos, mas que Elas “ensinam principalmente o que o homem deve crer acerca de Deus e o dever que Deus requer do homem”(CMW, p. 5. Cf. Ec 12.13)

Onde está o Soli Deo Gloria no Culto? Nas inserções extrabíblica, antibíblica e não-bíblica? Centralizam-se no Homem e nos seus desejos? O Culto que deveria ser, em primeiro lugar, para Glorificar a Deus, é voltado para satisfazer a necessidade emocional do pecador, até mesmo substituindo a Edificação dos filhos de Deus. É clara inversão da ordem “glorificar” e então “ter prazer” em Deus.

James M. Boice escreveu certa vez:

Meu argumento é que o motivo pelo qual a igreja evangélica atual está tão fraca e o porquê de não experimentarmos renovação, embora falemos sobre nossa necessidade de renovação, é que a glória de Deus foi, em grande, parte esquecida pela igreja. Não é muito provável vermos avivamento de novo enquanto não recuperarmos as verdades que exaltam e glorificam a Deus na salvação. Como podemos esperar que Deus se mova entre nós, enquanto não pudermos dizer de novo, com verdade: ‘Só a Deus seja a glória’? O mundo não pode dizer isso. Ao contrário, está preocupado com sua própria glória. Como Nabucodonozor, ele diz: Veja essa grande Babilônia que construí pelo meu poder e para minha glória" . Os arminianos não podem dizê-lo. Podem dizer ‘a Deus seja a glória’, mas não podem dizer ‘só a Deus seja a glória’, porque a teologia arminiana tira um pouco da glória de Deus na salvação e a dá para o indivíduo, que tem a palavra final em dizer se vai ou não ser salvo. Mesmo aquelas pessoas do campo reformado não podem dizê-lo, se o principal que estão tentando fazer nos seus ministérios é edificar seus próprios reinos e tornar-se importantes no cenário religioso. Nunca vamos experimentar a renovação na doutrina, no culto e na vida enquanto não pudermos dizer honestamente: ‘só a Deus seja a glória’” (1999, p.192-193).

Nada é mais ofensivo ao Deus Soberano, do que roubar-lhe a Glória! “Por amor de mim, por amor de mim o farei, porque, como seria profanado o meu nome? E a minha glória não a darei a outrem”(Is 48. 11). Você acredita que alguém entrará no Céu sendo ladrão da glória de Deus?

Soli Deo Gloria
Gaspar de Souza




Notas:

[1] Palavras de Martinho Lutero

[2]O Verbo está no Coortativo, expressando deliberação da parte do Criador, uma espécie de imperativo na primeira pessoa - queremos fazer o Homem

5 comentários:

Anônimo disse...

Verdadeiras palavras, Gaspar!
É por esse e outros motivos que passarei a visitar esse blog.

Abraço!
(SDG)

Bya Guedes Bueno ;)

Anônimo disse...

Parabéns pelos artigos!
Presb.Fábio Correia
www.filosofiacalvinista.blogspot.com

Gaspar de Souza disse...

Obrigado, Bya e Fábio, pelos comentários.

Sintam-se à vontade para novos comentários. Vocês estão em casa.

Gaspar de Souza

Jorge Pereira disse...

Ótimo artigo gaspar. Somente se adora ao Senhor, aquele que verdadeiramente teve um novo nascimento. Isto é um fato. O que vemos em nossas igrejas nos dias atuais, com certeza é idolatria não adoração. Se não existe uma adoração verdadeira ao nosso Deus, com certeza ela está sendo dirigida a outros deuses. Um abraço.

Anônimo disse...

suas postagens foram no minino... mediocre e toscas, você não passa de um cristão tapado que acha que os gays são uma praga ou coisa assim, além do mais vocês cristões são uma BOSTA, veneram um ''DEUS'' se é que pode chamar uma coisa que nem existe de Deus, vivem dizendo que deus criou o mundo,ótimo, e o que deus fazia antes de criar o mundo, ficava de braço cruzado no universo esperando o boi passar ?
e a arca de noé ? seria preciso um cruzeiro 10 vezes maior q o titanic pra levar um par de cada animal do mundo... sem contar nas histórias toscas que vocês contam as crianças, taí minha sobrinha estuda na porra de um colégio católico e chega em casa alienada..."deus isso... deus aquilo" vocês diviam eram todos serem erradicados do planeta terra, deviam fazer um holocausto de vocês, aposto que o mundo ficaria bem melhor, vocês são um povo preconceituoso, uns merda, não servem pra porcaria nenhuma a não ser pra espalhar o caos e o preconceito, e oque falar dessas missas idiotas ? ham ficar de joelhos repetindo uma reza idiota pra que ? e enquanto aos cultos evangélicos ? eu nunca perderia meu tenpo indo para um culto, ficar chorando se lamentando, ficar gritando no ouvido de todo mundo:"ALLELUIA, GLÓRIA A JESUS" vocês são perda de tempo,dinheiro jogado fora, e quer saber esse tal de JESUS devia era ter morrido mesmo, quem mandou não seguir as tradições romanas, ele tava era muito do "lonbrado" quando saiu porai pregando "A PALAVRA DE DEUS"
quer saber meu querido VÁ SE FUDER você e seu DEUS por que eu não presciso ném de você ném dele pra ser feliz... tchau, já fui