quinta-feira, 24 de setembro de 2015

ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE TEONOMIA

G. I. Williamson

Traduzido com notas por Gaspar de Souza
Toda Escritura é inspirada por Deus e útil para ensinar, para reprovar, para corrigir, para treinar na justiça(2Tim 3.16). Por “toda Escritura”, Paulo quer dizer o Antigo Testamento, incluindo a Lei de Moisés completa. Segue-se, portanto, que as leis do Antigo Testamento têm valor permanente.

Foi por essa razão que Calvino, em seu comentário sobre os Cinco Livros de Moisés demonstrou como cada “jurisprudência” ensinava um princípio permanente. Ele fez isso organizando todas essas leis sob um ou outro dos Dez Mandamentos. Ele mostrou como cada um deles ajuda-nos a entender a intenção e significado – e devida aplicação – dos Dez Mandamentos centrais.

Eu continuo convencido que o Reformador estava essencialmente correto. Eu não acho que ele sempre estava certo, ou que ele necessariamente organizou cada jurisprudência sob sua devida posição (alguns, sem dúvida, poderiam ser colocados sob um mandamento diferente). Mas ele me convenceu que existe um princípio permanente em cada jurisprudência do Antigo Testamento. Em minha opinião, os teonomistas merecem crédito aqui. Eles estão tentando fazer na nossa geração o que João Calvino fez em sua.

No entanto, pode parecer bem tornar este ponto bastante claro. Com a vinda de Cristo, o sistema Mosaico foi posto de lado de uma vez por todas. Se a teonomia procurasse colocar-nos sob esse sistema novamente, certamente eu me oporia. Mas, ela faz isso? Não tenho visto evidências convincentes de que eles façam isso. Sim, eu tenho ouvido adversários da teonomia alegar que eles fazem, mas não é isto que o teonomistas dizem. Então, realmente somos confrontados com uma questão básica: se nós ainda usáramos “os testemunhos da Lei e dos Profetas para confirmarmo-nos no Evangelho e, também, para regularmos nossa vida em toda honestidade, para a glória de Deus, conforme sua vontade”(Confissão Belga, Artigo 25. Ênfase adicionada)? Eu creio que a resposta só pode ser sim, e que isso se aplica aos governantes civis.

Aqui está o busílis. Teonomia, para muitos, posa hoje o espectro da opressão civil. “Se formou longe com isso”, eles dizem, “então vamos acabar perseguindo, e até mesmo matar, pessoas”. E é verdade que a pena de morte era requerida para algumas coisas, segundo essas leis, que não são tão castigadas hoje. Mas o leitor deve ter tempo para refletir sobre duas coisas.

A primeira é que a Lei de Moisés vem de Yahweh. Devemos, portanto, ser cuidadosos em ter uma visão negativa desses preceitos sagrados. Eu posso não entender por que Deus exigira a punição que ele exigiu, mas eu não tenho direito de estabelecer por mim mesmo como juiz dessas leis. Não, mil vezes não. Não há nada de indigno nessas leis do verdadeiro Deus. Se eu tenho dificuldades com elas, o problema está em mim, não naquelas leis
.
A segunda é que sob nossa lei atual, também existe o matar. E aqui eu vejo um problema ainda não resolvido na posição daqueles que se opõem à teonomia. É a ambiguidade fundamental em seu argumento para uma ordem civil pluralista.

Um escritor defende uma visão não-teonomista do estado com essas palavras: “o estado necessariamente é ‘pluralista’ no sentido que ele permite aos seus cidadãos liberdade de consciência para adorar como eles devem”. Isso soa bem. Mas agora o outro lado desse segundo principio: “o estado deve agir quando os princípios morais permanentes e básicos (como contidos na Segunda Tábua da Lei) são substituídos ou ignorados”. Aqui existe, por exemplo, uma referência à tarefa do estado de exercer justiça contra aqueles que roubam, assassinam, mentem etc. Mas eu não vejo como esses dois princípios possa coexistir em qualquer relacionamento estável. Na verdade, nosso problema hoje é precisamente que o primeiro desses princípios está devorando o segundo à distância. Permita-me ilustrar.

Já houve uma época em que a lei, na maioria dos países ocidentais, era fortemente anti-homossexual. Nossas leis já foram intencionalmente mais próximas dos padrões bíblicos. Em uma palavra, nós tínhamos alguma teonomia em matéria civil. Mas agora, em todo mundo Ocidental, isto está desaparecendo. Homossexuais estão “a céu aberto”. Eles exigem o direito de expressar seu estilo de vida. E quando o estado é pluralista em permitir a seus cidadãos “liberdade de consciência para adorar como eles acreditarem que devem”, isso não pode ser evitado.

Alguns Cristãos tendem a dizer: “Bem, e daí? Contanto que eles não ofendam a outros, qual o problema?” O problema é esse: tolerância (pelo estado) do mal prejudica a outras pessoas. Dou alguns exemplos.

(1) Se homossexuais têm “direitos iguais” – e não podem ser “discriminados” em sua conduta, então a lei deve proteger seu direito de ensinar as crianças nas escolas. Mas, será que alguém pensa que eles não influenciarão as crianças com seu estilo de vida, bem como pelo seu ensino? Claramente, a neutralidade é um mito.[1]

(2) Na população em geral, a AIDS tem sido transmitida através da transfusão de sangue. Quando “gays” doaram seu sangue, a AIDS foi aprovada junto com eles. Então você não tem uma sociedade segura se, em última análise, ela for pluralista.[2]

(3) A antiga ordem jurídica está, agora, esmorecendo, enquanto uma nova ordem está cada vez mais e mais dominante. Isto é visto claramente no fato de que o estado agora sanciona o derramamento de sangue de crianças que ainda não nasceram. A ordem jurídica mais antiga – de alguma maneira teonomista – a protegia. Agora, a emergente ordem jurídica humanista protege aqueles que matam as crianças.[3]

Não me impressiona, portanto, com o argumento do “medo”. Refiro-me ao medo de que se o estado adotar uma ordem jurídica bíblica, poderia haver um grande massacre. Evidentemente, haveria morte. Mas há morte agora – e muita. O fato de que a carnificina é oculta aos olhos, não significa que não exista tal coisa. Há sim. Então, a questão não é se haveria morte, mas que deveria ser morto. Deveria ser o culpado ou o inocente?[4]

Hoje, frequentemente é o inocente. Francamente, eu preferiria o sistema mais antigo onde fosse mais frequente o culpado que morresse.

Quando eu cresci, John Dillinger estava vagando por aí matando pessoas. Eu me senti muito melhor quando foi noticiado que ele havia sido morto. Eu pensei: “Bem, foi muito ruim que sua vida acabasse dessa maneira, mas é melhor do que pessoas inocentes morrerem”(Naqueles dias eles ainda usavam a cadeira elétrica. Realmente, uma execução é uma coisa terrível. Mas existe uma coisa realmente pior: deixar assassino soltos para que eles assassinem novamente. Isto é o que vemos hoje com muita frequência!). Os leitores desse periódico vão concordar com grande parte do que dizemos. Tomemos, por exemplo, o homessexualismo. Todos nós nos opomos a ele.  Mas isso não é tudo. Nós também citamos o Antigo Testamento para provar que estamos certo. Em 1980 nós, do Sínodo Reformado Ecumênico, declaramos que toda prática homossexual é pecado, e citamos Moisés para prová-lo. O que me impressiona, então, é o seguinte: todos nós somos teonomistas quando nos convêm. A verdadeira questão, portanto, não é teonomia ou nenhuma teonomia. A questão é como nós seremos consistentes em aplicar essas leis.

Isso soaria que estou no movimento teonomista? Eu não estou. Uma coisa que tem me forçado ser cauteloso é a falta de coerência por parte dos teonomista. Veja, por exemplo, sua visão do Sabbath. Se eu entendo certos teonomistas, eles dizem não existir o mesmo tipo de continuidade para esse mandamento como existe para os demais. Mas outros teonomistas terão uma visão fortemente diferente. Ou, dando outro exemplo, um teonomista fortemente defende escolas Cristãs, mas ainda assim diz que sindicatos são errados. Eu não acho essas coisas consistentes ou convincentes.

O que nós precisamos, então, é ficar longe da mera reação à palavra teonomia. Em vez diso, precisamos começar especificar as coisas. Se você disser que é um teonomista, muito bem, mas me diga (como Calvino fez) o que este caso particular da lei significa para hoje. Qual o princípio nela e como aplicá-la. Se você não pode fazer isso, então nem aqui, nem em lugar algum você é um teonomista.

Da mesma forma, se você me disser que  você não é um teonomista, eu direi: “Muito bem! Mas como você me mostra o princípio aqui e sua aplicação”. Se o melhor que você pode dizer é “Bom, isto é o Antigo Testamento e nós somos Cristãos do Novo Testamento”, então eu não serei capaz de comprar sua posição anti-teonomista. O que nós precisamos, então, é um fim às reações automáticas e aos xingamentos. Precisamos, sim, começar a tratar um ao outro com respeito, e discutir nossas diferenças paciente, cuidadosa e, acima de tudo, calmamente, com constante referência ao texto da Bíblia.

New Horizons, April 1994

Fonte: http://www.reformed.org/ethics/index.html?mainframe=/ethics/GI.html


[1] Veja, por exemplo, a discussão de gênero nos programas educacionais das Escolas Brasileiras e que tem encontrado resistência em Câmaras Municipais. A matéria do Jornal Folha de São Paulo (04/12/2012): “Professores Gays têm dificuldades para assumirem na escola, diz pesquisa”(Disponível em: < http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/1195164-professores-gays-tem-dificuldades-para-se-assumirem-na-escola-diz-pesquisa.shtml>. Também a matéria “PT quer cotas pra professores homossexuais, denuncia deputado”< http://noticias.gospelprime.com.br/pt-cotas-professor-homossexuais-jair-bolsonaro/>

[2] Matéria  do G1 (03/06/2015): “Homens homossexuais são impedidos de doar sangue”(Disponível em: < http://g1.globo.com/bom-dia-brasil/noticia/2015/06/homens-homossexuais-sao-impedidos-de-doar-sangue.html>.  Ver também “Homossexuais enfrentam obstáculos para doar sangue em mais de 50 países, inclusive o Brasil. Está na hora de mudar isto”(Disponível em: < http://www.brasilpost.com.br/otavio-dias/gays-podem-doar-sangue_b_6261698.html>)

[3] Jornal o Dia (24/03/2015): “Projeto de lei que legaliza o aborto é protocolado na câmara”. Disponível em< http://odia.ig.com.br/noticia/brasil/2015-03-24/projeto-de-lei-que-legaliza-aborto-e-protocolado-na-camara.html>. Ver também ACI Digital (21/07/2015): “"Ex-funcionária da Planned Parenthood revela o que a gigante do aborto faz com órgãos de bebês"(Disponível em: < http://www.acidigital.com/noticias/ex-funcionaria-da-planned-parenthood-revela-o-que-a-gigante-do-aborto-faz-com-orgaos-de-bebes-27783/>)

[4] UOL Notícias (27/05/2014): “"Brasil bate recorde histórico de homicídios". Disponível em: < http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2014/05/27/brasil-tem-recorde-historico-de-homicidios.htm>. Veja também Felipe Moura Brasil (08/06/2015): “Menores mataram 4 vezes mais que regime militar: 1.848 (no mínimo) a 424 (no máximo). Agora virou “apenas”?"(Disponível em: < http://veja.abril.com.br/blog/felipe-moura-brasil/2015/06/08/menores-mataram-4-vezes-mais-que-regime-militar-1-848-no-minimo-a-424-no-maximo-agora-virou-apenas/>

sábado, 4 de julho de 2015

Minhas considerações acerca da publicação do Dep. Raul Jungmann em 02 de julho de 2015, 19h21min em seu mural do Facebook

Em uma sociedade democrática de direito, qualquer político ou pessoa de vida pública deve esperar questionamentos de suas ações. Um político deve satisfação aos seus eleitores. Sua vida pública começa e encerra-se no povo. Sendo assim, V.Exa. cumpre com seu papel em responder aos questionamentos levantados, o que isso é bom. Porém, embora seus esclarecimentos sejam apresentados, penso que eles fogem à realidade de muitos brasileiros e, parece-me, de quem também apoia sua legislatura.
            Para V.Exa, há um processo de desinformação em temas relevantes como a redução da maioridade penal. Nesse processo, a própria população é ignorante. Na verdade, esse discurso de que “a população é desinformada” pertence àqueles que se querem tutores do povo. Ora, se essa mesma população é desinformada sobre alguns temas, desinformada também é ao outorgar poderes aos seus representantes. O Deputado age como um gnóstico que tem informações privilegiadas, dadas por uma revelação superior dos estatísticos. Caro deputado, a população não é desinformada. Se há uma época de informações livres, independentes da Mídia Televisiva ou Radiofônica, é a nossa. As informações pululam a cada blog, site, nos microblogs, em jornalistas sérios que não venderam sua pauta aos políticos que anteriormente ditavam as informações que, aí sim, desinformavam. Esse é o caso da eleição da presidente Dilma. A população foi ludibriada por desinformação marqueteira. As verdadeiras informações estavam à cara, nas denúncias do mensalão e petrolão. A maioria da população acreditou na propaganda, fonte máxima do petismo para desinformar e causou efeito desejado exatamente na parcela da população que, possivelmente, não tem acesso à informação veraz. A máscara caiu quando passou a eleição, pois a sensação que se tinha no mercado, mas que fora maquiada pela propaganda, tornou-se real. Lembremo-nos que o candidato Aécio Neves denunciava publicamente esses casos. Mas a candidata, além dos ad hominem de sempre, inflacionava números e estatísticas. Lembre-se que cerca de 51 milhões de eleitores que não votaram em Dilma não estão arrependidos. Nesse seu argumento, caro deputado, V.Exa. comete falácias. Primeiro, não se segue da premissa que os que votaram em Dilma se arrependeram a conclusão de que os que querem a redução da maioridade penal também se arrependerão. Não “é a mesma coisa”. Além de ser uma feia derrapagem. Sua conclusão, da premissa, portanto, é irrelevante, pois é apenas um apelo psicológico. E nesse sentido, é V.Exa quem está vendendo gato por lebre para a população.
            Caro deputado, o Estatuto da Criança e Adolescente tem se mostrado ineficaz no combate às infrações que são, na verdade, crimes hediondos. E a ressocialização de “menores infratores” é uma utopia enquanto medidas mais duras não forem aplicadas eficazmente. Absolutamente ninguém quer ver adolescentes criminosos com adultos criminosos. Sou Cristão, deputado, e por isso acredito na recuperação do ser humano. Porém, como Cristão, também sei que é do coração que procedem os males dos homens: “A estultícia está ligada ao coração da criança, mas a vara da correção a afugentará dela” (Provérbios 22:15). Daí minha posição conciliar ambas as questões: aos realmente arrependidos, acolhimento, embora devam ser punidos por seus crimes; mas aos criminosos contumazes, irreconciliáveis e sem afeição natural, os rigores da justiça retributiva. Que o ECA seja aperfeiçoado para medidas mais fortes contra menores, mas que não descuidemos de procurar as motivações da malignidade dos atos desses muitos menores, “porque do interior do coração dos homens saem os maus pensamentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios, os furtos, a avareza, as maldades, o engano, a dissolução, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura”(Jesus no Evangelho de Marcos, 7.21, 22).
            Caro Deputado, não seja ingênuo sobre colocar “menores e adultos na mesma cela”, pois os menores criminosos já estão com adultos criminosos no tráfico e em outros crimes. Seu pressuposto de que lançar menores criminosos em cadeias lotadas “não resolve[m] a questão da criminalidade” é o mesmo que dizer que lançar doentes no sistema público de saúde não resolve o problema das doenças, então deixemos todos doentes. O problema de superlotação penitenciária se resolveria com a construção de novos presídios públicos – paga-se impostos também para isso – ou privados; resolve-se com a agilidade da justiça em julgar os casos de menor potencial ofensivo, e resolve-se aplicando rigorosamente as penalidades da lei – Salomão já dissera: “Porquanto não se executa logo o juízo sobre a má obra, por isso o coração dos filhos dos homens está inteiramente disposto para fazer o mal”(Eclesiastes 8. 11). Se as cadeias estão lotadas, pode-se pensar que existem muitos criminosos no Brasil, e se existem, então lugar de bandido é na cadeia mesmo. Porém, caro deputado, os socialistas brasileiros estão preocupados demais com os “direitos dos manos” do que os direitos dos cidadãos de bem desse país. Crime se combate com punição justa. Bandido não tem medo da lei hoje porque está completamente amparado em discursos de vitimização, de que estão no crime por falta de oportunidade etc. Não, caro deputado, o crime não tem classe, nem cor, nem gênero. O crime acontece em todos os estratos sociais – ricos e pobres, negros e brancos, homens e mulheres, jovens, adolescentes e adultos. Mas, o discurso de “luta de classe” tem imposto uma lógica de que quem não tem (ou não teve) oportunidade é vítima da sociedade, e quem teve oportunidade é culpado pela violência que os criminosos lhes aplicaram. Já é hora, deputado, de afirmarmos o discurso da “responsabilidade pelos seus atos”(o que o homem semear, isso ele colherá), pois “o agente valora o que pretende fazer”(Roger Scruton)
            Deputado, o senhor incorre no “mito 5” ao falar sobre as nações que se arrependeram da maioridade penal para menos de 18 anos (Sete mitos sobre a maioridade penal – e o caminho para um debate racional – Disponível em: < http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/sete-mitos-sobre-a-maioridade-penal-e-o-caminho-para-um-debate-racional>. Deputado, do Grupo dos 7 países mais industrializados e desenvolvidos do mundo e com características semelhantes às do Brasil, inclusive em relação a taxas de criminalidades, apenas o Brasil fixa em 18 anos a idade que um jovem pode ser julgado como adulto. A redução da maioridade penal não tem por objetivo diminuir a criminalidade, mas combater a iniquidade de jovens que cometem crimes graves. Concordo com V.Exa que é preciso criar condições para desenvolvimento da juventude, mas é o próprio governo que impede essas possibilidades quando, por exemplo, vigia os pais que inserem seus filhos nas atividades diárias e pequenos trabalhos, ou que os disciplinam com alguma palmada. Afinal, não foi o próprio governo que cortou cerca de 9 bilhões da Educação? Não foi o Governo que criou mecanismos para cada vez mais solapar a autoridade dos pais, dos professores, de eclesiásticos, da polícia e militares e também de políticos como o senhor? No tocante a autoridade, caro deputado, não há “lugares vazios”.
            Aliás, por falar em educação, os índices mundiais mostram como nós, brasileiros, somos classificados nos rankings. É que nossos “profissionais em educação” estão ocupados demais com militância ou burocracia. Ou preocupados demais em fazer greves ideológica, militando em sala de aula, em vez de ensinar português, matemática, geografia etc., e isso sem o viés ideológico marxista que domina nossos “professores”. Por isso, “quem pode elogiar um sistema educacional que produz jovens incrivelmente ignorantes – exceto por uma pequena minoria – em História, Geografia e idiomas estrangeiros [quando nem o próprio idioma dominam – N.A], e extremamente despreparados para lidar com quaisquer problemas maiores do que os da própria vizinhança”(Russel Kirk). Daí nossos políticos, não sei se todos, se querem tutores dos brasileiros. Infelizmente, o intervencionismo estatal só tende a se agigantar, como se quanto mais estado melhor, e não se percebe que quanto mais estado, menos liberdades individuais. O Estado brasileiro, aos poucos, usurpa para si a responsabilidade dos menores e adultos criminosos quando diz que a culpa é da falta de oportunidade e da falta de educação.
            Portanto, caro deputado, reduzir a maioridade penal para menos de 16 anos não seria inconcebível se, em vez de V.Exa. ver “crianças inocentes” avaliasse a intencionalidade de tais crianças. Ainda como diz Provérbio: “Até a criança se dará a conhecer pelas suas ações, se a sua obra é pura e reta”(Provérbios 20.11).
Enfim, deputado, esperar-se-ia mais compostura de vossa parte. Ataques à população e aos colegas parlamentares não condizem com um político de sua envergadura. Costumo acompanhar suas intervenções na mídia. Confesso que seria simpatizante a algumas de suas ideias – por exemplo, opor-se às leis que invadam a esfera privada da vida familiar. Porém, duas delas impedem-me de apoiá-lo. A mais nova é seu conceito de juventude ligada ao crime – eles são criminosos, deputado, e crime se combate com justiça punitiva. Isso não é, como V.Exa. disse, “desejo de vingança”. A outra ideia, deputado, é sua ferrenha defesa do desarmamento do cidadão de bem que tem direito à legítima defesa. É um direito de sua consciência manifestar suas convicções e princípios em seu voto na Câmara. É direito dos brasileiros de bem, sob convicções e princípios também justos – o que querem senão justiça verdadeira e segurança apropriada? – posicionarem-se contra sua ideologia sem ser considerada ignorante, vingativa, representada por mentirosos (seus pares)
Com o respeito à V.Exa, e à disposição,
Gaspar de Souza, pastor presbiteriano

quinta-feira, 2 de julho de 2015

A FILOSOFIA DE GÊNERO

Dr. Douglas Groothuis
Traduzido e publicado com permissão do autor
Tradutor: Gaspar de Souza

Ideias têm consequências, mas poucos entendem como as consequências estão enraizadas em e fluem das ideias. O assunto de casamento de mesmo sexo e gênero não pode ser entendido sem uma análise filosófica. A decisão da Suprema Corte de que a proibição do casamento homossexual é contra A Constituição é jurisprudência patética, mas sob dessa cosmovisão estão pressupostos que deveriam ser expostos à luz da razão.

Gênero agora é considerado um conceito flexível; não é mais dado pela natureza de alguém. A Biologia agora não tem mais a fazer com o gênero. Em vez disso, toma-se um gênero de alguém por identificá-lo com uma vasta gama de possibilidades. A natureza do organismo humano – sob o DNA – é irrelevante para identidade de gênero.  A tradição da raça humana de que macho e fêmea são categorias fixas e perpétuas de seres nada significa para os experimentalistas de gênero. Homens podem identificar-se com mulheres (e, talvez, ter uma operação de mudança de sexo); mulheres podem identificar-se com homens (e, talvez, ter uma operação de mudança de sexo); homens podem identificar-se bissexuais; mulheres podem identificar-se como bissexuais. Macho e fêmea podem identificar-se como parcialmente heterossexuais e parcialmente homossexuais.

Como essa redefinição de identidade humana aconteceu? Antes de tentarmos responder a isso, considere a metafísica do movimento em relação ao Teísmo Cristão, uma cosmovisão cada vez mais rejeitada pelos agentes do poder da cultura America.

Cristãos, juntamente com Judeus, sabem que o universo tem um significado intrínseco dado por um Deus infinito e pessoal, o Criador e Projetista do universo. Este ser, que pensa, fala e age, trouxe os humanos à existência como seus representantes; como tal, eles possuem racionalidade, vontade, emoções e relacionamentos. Como o primeiro livro da Bíblia ensina:

E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra.  (Gênesis 1. 27, 28)

Esta declaração é filosoficamente rica de significado. Os humanos têm uma natureza dada por Deus, uma constituição como macho e fêmea. Isto é um dado divinamente outorgado. Isto é, os humanos são uma espécie especial de ser, como é o resto da criação viva. Antes da criação dos humanos, Gênesis registra que:

E disse Deus: Produza a terra alma vivente conforme a sua espécie; gado, e répteis e feras da terra conforme a sua espécie; e assim foi. E fez Deus as feras da terra conforme a sua espécie, e o gado conforme a sua espécie, e todo o réptil da terra conforme a sua espécie; e viu Deus que era bom (Gênesis 1. 24, 25. Grifos do autor).

A palavra espécie não deveria ser tomada de maneira biologicamente precisa; em vez disso, ela fala de uma forma distinta de ser, uma essência. Deus não criou o cosmos e os humanos de uma maneira de valor-neutro. Pelo contrário, o significado e a função apropriada das entidades vivas são especificados por seu criador e exaurido em seu próprio ser. Nossos primeiros pais rejeitaram a ordem e mandamento de Deus fora motivadas pelo desejo de redefinir a realidade independente de Deus. A rejeição da palavra de Deus sobre os termos de Deus resultou na Queda, cujos efeitos foram sentidos através das eras (Gênesis 3). Movendo-se desde a Criação até a Ressurreição, o Apóstolo Paulo afirma categorias objetivamente reais da realidade – viva e não-viva – em seu grande discurso sobre a ressurreição de Cristo e dos Discípulos de Cristo.

Nem toda a carne é uma mesma carne, mas uma é a carne dos homens, e outra a carne dos animais, e outra a dos peixes e outra a das aves. E há corpos celestes e corpos terrestres, mas uma é a glória dos celestes e outra a dos terrestres. Uma é a glória do sol, e outra a glória da lua, e outra a glória das estrelas; porque uma estrela difere em glória de outra estrela.(1 Coríntios 15.39 – 41)

Não é preciso aprofundar maiores detalhes no argumento para perceber que ele ensina que Deus tem especificado a natureza das coisas. Sendo assim, as criaturas deveriam acatar as instruções do Criador no modo como elas vivem suas vidas mortais neste planeta.

Jesus ensinava e pensava dentro dessa cosmovisão. Quando perguntaram-lhe sobre casamento e divórcio, ele apelou para a natureza dos homens e mulheres:

Então chegaram ao pé dele os fariseus, tentando-o, e dizendo-lhe: É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo? Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez, e disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne? Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.(Mateus 19. 3 – 6)

Quando alguém rejeita a existência de Deus (ou simplesmente a ignora), ele não está simplesmente rejeitando uma ideia filosófica ou religiosa. Ele está rejeitando todas as ideias e práticas que são singularmente apoiadas pelo Teísmo Cristão. Friedrich Nietzsche (1844 – 1900) entendeu muito bem isto. Em sua famosa parábola “O Louco”(em Gaia Ciência), Nietzsche deixa seu profeta falar das implicações da “morte de Deus”

Como nos consolar, a nós, assassinos entre os assassinos? O mais forte e mais sagrado que o mundo até então possuíra sangrou inteiro sob os nossos punhais – quem nos limpará este sangue? Com que água poderíamos nos lavar? Que ritos expiatórios, que jogos sagrados teremos de inventar? A grandeza desse ato não é demasiado grande para nós? Não deveríamos nós mesmos nos tornar deuses, para ao menos parecer dignos dele? Nunca houve um ato maior – e quem vier depois de nós pertencerá, por causa desse ato, a uma história mais elevada que toda a história até então!” nesse momento silenciou o homem louco, e novamente olhou para seus ouvintes: também eles ficaram em silêncio, olhando espantados para ele. “Eu venho cedo demais”, disse então, “não é ainda meu tempo. Esse acontecimento enorme está a caminho, ainda anda: não chegou ainda aos ouvidos dos homens. O corisco e o trovão precisam de tempo, a luz das estrelas precisa de tempos, os atos, mesmo depois de feitos, precisam de tempo para serem vistos e ouvidos. Esse ato ainda lhes é mais distante que a mais longínqua constelação - e no entanto eles o cometeram!"[1]

Sim, “e no entanto eles o cometeram!” por banir Deus de seus pensamentos, suas vidas e suas culturas. Deus está morto para o ímpio, mas permanece obstinadamente vivo como Criador e Juiz. O Psicólogo Eric Fromm (1900 – 1980) escreveu que no século dezenove Deus morreu. No século vinte o homem morreu. Se o homem não foi criado por Deus, por que deveria se importar muito com ele? A colheita amarga foi a dezenas de milhões assassinados pelo Nazismo e Comunismo. No século vinte e um o gênero morreu, desde que o homem não concedeu a natureza por Deus. O gênero agora é desequilibrado da biologia, história, lógica e religião. Ele é flexível, fungível, maleável e infinitamente inconstante, uma vez que não precisa obedecer a nada objetivamente real. A discussão de gênero está em toda a parte; [mas] o fato do gênero não está em lugar nenhum, desde que os fatos fazem muitas exigências sobre as mentes livres.

Francis Schaeffer (1912 – 1984), filósofo e crítico social, discerniu esta ruptura da realidade dada de Deus em 1968 em sua obra de referência, O Deus que Intervém:

Algumas formas de homossexualismo de hoje são de natureza tal que não se limitam ao homossexualismo somente, mas representam uma forma de expressão filosófica. Precisamos ter compreensão para com o real problema da homofilia. Mas grande parte da homossexualidade moderna é expressão da atual negação da lei da antítese. Neste caso, isso levou à negação da distinção entre homem e mulher. De modo que se extinguiu a ideia de macho e fêmea, visto como parceiros complementares [...] Para grande parte do pensamento moderno, a ordem do dia é combater todas as antíteses e toda a lógica da criação divina – inclusive a distinção macho e fêmea.[2]

Schaeffer viu a origem do problema: as pessoas estavam negando a antítese real entre verdade e falsidade, entre bem e mal, entre o que Deus criou e o que o homem corrompeu. Mas mesmo Schaeffer – profeta que foi – não poderia ter visto a extensão em que a realidade seria negada em nome do amor, tolerância, escolha e liberdade.

Vamos tentar trazer tudo isso junto. A filosofia que sustenta e anima esta redefinição de gênero é anti-essencialista e construtivista. Os humanos como macho e fêmea não têm uma natureza objetiva, qua gênero. Gênero é apenas um espaço reservado para a vontade do identificador, que escolhe o gênero não com base qualquer coisa estável ou confiável, mas apenas pela excentricidade erótica. Alguém constrói uma identidade de gênero, mas sem o auxílio de um modelo. O que se constrói, pode ser destruído – caprichosamente sem fim. E agora essa filosofia é apoiada a toda força por lei federal. Se você discorda, você será punido. Tratarei disso num ensaio posterior.

Muito mais precisa ser articulado sobre essa nova corajosa revolução de gênero. Por enquanto, compreenda a cosmovisão – ideias têm consequências e ideias falsas têm más consequências. Basta olhar em sua volta.





[1] NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, § 125 (N.T)

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Mateus e o Molinismo (Conhecimento Médio)

Dr. Joseph R. Nally[1]
Traduzido por Gaspar de Souza

Pergunta: Mateus 11. 20 – 24 ensina o Molinismo (Conhecimento Médio)?

Resposta:
Ao teólogo Jesuíta Luis de Molina é, geralmente, atribuído a posição e origem do Molinismo, embora Fonseca e Lessius compartilhem das mesmas ideias. Eles usam textos tais como Mateus 11 para mostrar que Deus tem “Conhecimento Médio”. Em nossos dias, William Lane Craig afirma o mesmo, e a [denominação] The Baptist Faith and Message parece resumir o Molinismo: “O perfeito conhecimento [de Deus] se estende a todas as coisas, passadas, presentes e futuras, incluindo as decisões futuras de suas criaturas livres”(Artigo 2)

O Molinismo, em poucas palavras, declara que Deus tem três tipos de conhecimento: natural, médio e livre.

1) Conhecimento Natural é o conhecimento de Deus de todas os mundos possíveis (tudo que diz respeito ao que é necessário e possível no entendimento de Deus)

2) Conhecimento Livre é o conhecimento de Deus deste mundo atual. Por um “ato livre”, ele é capaz de conhecer o que ele conhece absolutamente(Até agora estamos bem, mas Molina diz que esse conhecimento (livre) não é alguma coisa que seja essencial em Deus)

3) O Conhecimento Médio declara que Deus não pode conhecer os atos livres futuros dos homens da mesma maneira que ele conhece outras coisas absolutamente.

Assim, de acordo com Molina, este Conhecimento Médio é dependente dos atos livres que os homens farão. Portanto Deus, em sua onisciência, espera pelo atos dos homens e, então, escolhe salvá-los com base em suas escolhas de serem salvos.

Agora, voltemos ao texto da questão (que está entre outros textos-provas de Êxodo 13.17; 1 Samuel 23.8 – 14; Jeremias 23.21, 22; 1 Coríntios 2.8)

Mateus 11. 20 – 24:  Então começou ele a lançar em rosto às cidades onde se operou a maior parte dos seus prodígios o não se haverem arrependido, dizendo: Ai de ti, Corazim! ai de ti, Betsaida! porque, se em Tiro e em Sidom fossem feitos os prodígios que em vós se fizeram, há muito que se teriam arrependido, com saco e com cinza. Por isso eu vos digo que haverá menos rigor para Tiro e Sidom, no dia do juízo, do que para vós. E tu, Cafarnaum, que te ergues até aos céus, serás abatida até aos infernos; porque, se em Sodoma tivessem sido feitos os prodígios que em ti se operaram, teria ela permanecido até hoje. Eu vos digo, porém, que haverá menos rigor para os de Sodoma, no dia do juízo, do que para ti.

Primeiro, o Conhecimento Médio é uma não-realidade. O conhecimento de Cristo é simplesmente natural (conhecimento de Deus de todos os mundos possíveis), não médio.

Segundo, Mateus 11 apenas prova o conhecimento de Deus de contrafactuais, não conhecimento médio. Como Travis Campbell, e Conhecimento Médio: Uma Crítica Reformada declara:

Na melhor das hipóteses, as passagens frequentemente usadas pelos defensores do conhecimento médio provam, se provam alguma coisa, apenas “que Deus, conhecendo todas as causas, tanto as livres como as necessárias, sabe o que qualquer criatura fará em quaisquer condições. Mesmo nós sabemos que se pusermos fogo à pólvora, seguir-se-á uma explosão.”(A.A. Hodge, Outlines of Theology [Carlisle, Pa.: Banner of Truth, 1972], 148). Em outras palavras, essas passagens bíblicas nos mostram apenas que Deus conhece a natureza dos agentes livres tão bem que, fossem os agentes colocados em outras circunstâncias, Deus sabia exatamente que eles fariam. E isso não reconcilia conhecimento médio com libertarianismo, mas com compatibilismo. Mais importante ainda, é certamente possível que Deus conhece esta informação logicamente apenas posterior ao decreto divino, eliminando assim a necessidade do conhecimento médio. Portanto, há pouca, se há alguma, garantia bíblica para scientia media.

Bastante interessante, Craig admite este ponto, dizendo:
Desde que a Escritura  não reflete sobre esse assunto, quase nenhum texto-prova pode provar que o conhecimento de Deus de contrafactuais é obtido logicamente antes de seu decreto divino. Isto é assunto para reflexão da teologia filosófica, não para exegese bíblica. Então, embora seja claramente anti-bíblico negar que Deus tenha conhecimento simples e mesmo conhecimento de contrafactuais, aqueles que negam o conhecimento médio não pode ser acusado de ser anti-bíblico((Craig, "Middle Knowledge View," 125.)

Terceiro, os defensores do Conhecimento Médio não podem deixar de fora, como Paul Harvey diria, “o resto da história”
Mateus 11.25 – 27: Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e entendidos, e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve. Todas as coisas me foram entregues por meu Pai, e ninguém conhece o Filho, senão o Pai; e ninguém conhece o Pai, senão o Filho, e aquele a quem o Filho o quiser revelar.

O Conhecimento Médio aqui é condenado. Quando Jesus diz, “Pai, Senhor do céu e da terra”, ele está dizendo que Deus em sua soberania tinha, em seu agrado, ocultado conhecimento de alguns e revelado esse mesmo conhecimento a outros. Mateus 11 não fala sobre Deus não conhecendo qualquer coisa até que o homem fizesse alguma coisa. Pelo contrário, já as conhece e apenas não quer revelá-las até/se ele desejar. Mateus capítulo 11 está ensinando sobre o justo julgamento porvir (Mt 11.15 – 19). Observe que isso não aconteceu ainda, mas  Cristo sabe que irá acontecer. Isto não é conhecimento médio, mas conhecimento natural e conhecimento livre para justamente agir como Deus vê e prepara segundo sua vontade.

Deus é soberano sobre todas as coisas(Prov. 16:33Mat. 10:29Rom. 11:36Ef. 1:11 etc.), até mesmo sobre as decisões humanas(Prov. 20:2421:1). Embora Deus não tente ninguém ao pecado (Tiago 1:13), ele ainda está agindo em todas as coisas, de indivíduos à nações, para o fim que ele tem desejado(Is. 46:10-11). O propósito de Deus não depende do homem(At 17:24-26), nem Deus descobre ou aprende(1 Jo 3:20Jó 34:21-22Sal. 50:11Prov. 15:3). Todas as coisas são decretadas pelo conselho infinitamente sábio de Deus(Rom. 11:33-36).

A Confissão de Fé de Westminster substancia a posição ortodoxa no Capítulo III. 1 – 3, Dos Decretos de Deus:

I. Desde toda a eternidade, Deus, pelo muito sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas.
Isa. 45:6-7; Rom. 11:33; Heb. 6:17; Sal.5:4; Tiago 1:13-17; I João 1:5; Mat. 17:2; João 19:11; At.2:23; At. 4:27-28 e 27:23, 24, 34.

II. Ainda que Deus sabe tudo quanto pode ou há de acontecer em todas as circunstâncias imagináveis, ele não decreta coisa alguma por havê-la previsto como futura, ou como coisa que havia de acontecer em tais e tais condições.

At. 15:18; Prov.16:33; I Sam. 23:11-12; Mat. 11:21-23; Rom. 9:11-18.
III. Pelo decreto de Deus e para manifestação da sua glória, alguns homens e alguns anjos são predestinados para a vida eterna e outros preordenados para a morte eterna.

I Tim.5:21; Mar. 5:38; Jud. 6; Mat. 25:31, 41; Prov. 16:4; Rom. 9:22-23; Ef. 1:5-6.

Fonte:
http://thirdmill.org/answers/answer.asp/file/99657.qna/category/th/page/questions/site/iiim


[1] Dr. Joseph R. Nally, D.D., M.Div. é editor teológico no Third Millennium Ministries (IIIM).

quarta-feira, 27 de maio de 2015

MOLINISMO E SEMINÁRIO DE WESTMINSTER NA CALIFÓRINA

R. Scott Clark
Traduzido por Gaspar de Souza

Nos comentários a seguir, não estou falando em nome do Seminário de Westiminster na Califórnia. Tento esclarecer o que eu entendo ter sido o caso e o que eu entendo a ser a situação agora.
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Há muitos anos atrás, nossa Associação de Estudante convidou William Lane Craig para falar no campus sobre Conhecimento Médio (Molinismo). Historicamente, a Teologia Reformada tem ensinado que Deus tem Conhecimento Natural e Conhecimento Livre. Alguns críticos da Teologia Reformada têm afirmado que Deus tem outro tipo de conhecimento, o chamado “Conhecimento Médio”. Segundo o Conhecimento Médio, Deus sabe todas as contingências que seriam realizadas no mundo pelas pessoas com vontade livre, mas ele não sabe qual será realizada no mundo porque ele tem determinado permitir aos humanos exercitar suas livres vontades de escolher essas contingências. É um argumento engenhoso que tem ganhado renovo atual como uma alternativa ao Socianismo desmedido do Teísmo Aberto, mas é construído sobre exegese bíblica de má qualidade e um pouco de filosofia racionalista. É também uma visão para qual os teólogos reformados têm respondido por séculos.

A questão que tem sido levantada por alguns correspondentes e estudantes não é tanto sobre o Conhecimento Médio (nós o rejeitamos porque Deus preordenou, desde toda eternidade, que nós rejeitaríamos e escolheríamos livremente, isto é, sem compulsão externa, para agir de acordo com a nova natureza que Deus tem graciosamente nos dado rejeitá-la, o Espírito operou graciosamente por concursus em nós) mas sobre o que aconteceu quando Dr. Craig estava no campus. A questão surge porque ele afirmou que, em sua visita ao campus, um de nossos professores confessou que éramos todos ignorantes do Conhecimento Médio e incapazes de refutá-lo. Ele escreveu:

A poucos anos atrás eu falei sobre Conhecimento Médio no Seminário de Westminster em San Diego e, no momento de Perguntas e Respostas, um dos professores disse: “estou envergonhado em dizer, Dr. Craig, que nós não estamos mesmos capazes de discutir isso como você, porque nós não estamos completamente familiarizado com o que você está falando’. Ele estava envergonhado que como um teólogo profissional ele era tão ignorante desses debates.

Eu não sei com quem Dr. Craig falou. Comigo não foi. Duvido que tenha sido com Mike Horton ou com Bob Godfrey. Todos nós lecionamos sobre Conhecimento Médio em diferentes lugares no Currículo. Creio que eu ainda estava ensinando o módulo “Doutrina de Deus” quando Dr. Craig fez sua visita. Eu não assisti a essas palestras (não me lembro do motivo), mas eu acredito que estava ensinando sobre Conhecimento Médio em Teologia Sistemática 601. Lembro-me pesquisar sobre Conhecimento Médio (se antes ou depois da visita, não me recordo) e ampliar minhas aulas sobre os Atributos Divinos. Acredito que Bob Godfrey ministrou sobre Conhecimento Médio como parte de um Curso sobre Era Moderna e estou confiante que Mike Horton ministrou sobre Conhecimento Médio como parte do Curso Teologia Sistemática 601.
O tempo faz coisas divertidas com a memória. Dr. Craig ministra um monte de palestras em diversos lugares e, talvez ele tenha confundido uma palestra com outra, ou talvez um membro de outro departamento, quem não ensinou sobre essas coisas confessou sua própria ignorância nesta questão? Eu não sei o que aconteceu. Eu não estava lá, mas posso dizer com certeza que ensinamos sobre Conhecimento Médio e o rejeitamos pelas mesmas razões que Voetius e Turretin e outros o rejeitaram no século 17. Eu tenho lido as obras do Dr. Craig (quando eu ainda ensinava Sistemática) e estou satisfeito que a exposição Reformada da palavra de Deus é uma mais adequada exposição do que aquela sua.
Nós não precisamos ensinar (isto é, não existe nenhuma razão da Escritura ou Teologia) que exista um terceiro tipo de conhecimento em Deus. Como entendemos a partir das Escrituras, depois da Queda “deve” (quando Deus ordena que façamos alguma coisa) não implica “pode”. Como entendemos que as Escrituras ensinam que Deus é onisciente e onipotente de tal forma que ele nem é subordinado a nós, nem ele deseja fazer isso. Estamos absolutamente subordinados a ele.
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O que se segue é uma sinopse do material sobre essas questões e algumas respostas.
Confessamos que Deus é onisciente (Heb 4.13; Acts 2.23; Rom 8.29; 11.2; 1 Peter 1.2). Entendemos que a onisciência divina é aquela “perfeição de Deus pela qual Ele, de maneira inteiramente única, conhece-se a Si próprio e a todas as coisas possíveis e reais num só ato eterno e simples”(Berkhof, 1990, p.69)
Voetius disse que Deus “…conhece todas as coisas de si, em si e através de si”(Is 40.13, 14; Rom 11.34). O conhecimento de Deus é eterno, imutável, sem sucessão. Deus conhece em uma “simples intuição”(Sl 7.10; 139.2 – 5; Jer. 17.10; Hb. 4.13). O conhecimento de Deus é necessário até mesmo quando trata com “coisas livres, contingentes e...indeterminados em sua natureza; de forma que não pode ser suscetível a qualquer ignorância, erro ou dúvida...”. Seu conhecimento não é impulsionado por qualquer coisa fora de si mesmo.
O conhecimento de Deus é exaustivo e eterno. Ele conhece enquanto ele quer e quer enquanto ele conhece. Sua vontade é coextensiva com seu conhecimento, isto é, ele conhece tudo que ele quer (embora ele não possa dizer ter desejado tudo que conhece, desde que ele conhece coisas que teriam sido e não são, e se elas não são, ele não as queria). Temos falado de dois aspectos do conhecimento divino, citando Voetius: “scientia necessária naturalis que precede cada ato da vontade na ordem de natureza, e pela qual Deus sabe no primeiro ato direto e altamente necessário (a) de si mesmo em si e para si; então (b) todas as coisas possíveis, não em si mesmas, mas em sua essência como sua causa necessária e, (c) scientia libera, pela qual, segundo o decreto de sua vontade ele sabe determinantemente todas as coisas existentes, em  seja qual for a diferença de tempo em que elas estão, seja no presente, passado ou futuro”.

A doutrina Molinista da scientia media é sutil, mas sutileza, como sabemos a partir das Escrituras, nem sempre é uma coisa boa. Todavia, eu não compartilho com a avaliação do Dr. Craig que o Conhecimento Médio é “surpreendente em sua sutileza e poder...”. Ele tem uma visão muito elevada do Conhecimento Médio. Ele diz que, “na verdade, eu arriscaria dizer que ele é o único conceito teológico mais frutífero que já encontrei em meu próprio trabalho...”(William Lane Craig, “The Middle-Knowledge View,” in Divine Foreknowledge: Four Views, ed. James K. Beilby and Paul R. Eddy (Downers Grove: Inter-Varsity Press, 2001), 125).

Ele baseia seu argumento para o Conhecimento Médio na existência de “contrafactuais”. Ele diz que “contrafactuais são enunciados condicionais no modo subjuntivo”(idem, p. 120). “Deus”, ele diz, “conhece, por exemplo, o que teria acontecido se ele tivesse poupado os Cananitas da destruição; o que Napoleão teria feito se tivesse vencido a batalha de Walterloo; e o que Jones responderia se eu compartilhasse o Evangelho com ele”. Craig favorece o Conhecimento Médio não apenas porque ele faz concessões ao libertarianismo humano, “mas [porque também] proporciona a Deus os meios de escolher qual mundo de criaturas livres criar. Por saber como as pessoas escolherão livremente em quaisquer circunstâncias em que elas podem estar e Deus pode – por decretar colocar justamente aquela pessoa para justamente aquelas circunstâncias – trazer seus propósitos finais através das decisões das criaturas livres”(ibdim, p. 122). Craig argumenta que existem
Dois momentos lógicos antes do decreto divino: primeiro, o momento em que Deus tem conhecimento natural de vários mundos possíveis e, segundo, o momento em que ele tem conhecimento do próprio subconjunto dos mundos possíveis que, dados os contrafactuais verdadeiros naquele momento, são viáveis para ele criar.

Seu argumento bíblico centraliza-se sobre a existência do modo subjuntivo na Escritura. Ele apela para 1 Samuel 23. 6 – 10, onde Davi usa um colete sacerdotal para ter acesso à vontade divina. “O que o objeto tinha mediado a Davi não era, portanto, presciência simples, mas conhecimento contrafactual”.(ibdem, p. 123). E continua apelando a uma série de passagens que usa a palavra “seria/poderia”, por exemplo, Jeremias 37.17, 18, a partir do qual ele conclui que “ainda algumas previsões dadas pelos verdadeiros profetas, na verdade não viriam a acontecer porque as pessoas pré-avisadas responderam de maneira apropriada”(ibd, p.124). Ele também apela para Mateus 17.27 para argumentar que Jesus aprovou contrafactuais, que ele sabia o que poderia acontecer em certas circunstâncias, mas que não aconteceria. “Eu penso estar claro, então, que o Deus da bíblia exibe conhecimento contrafactual”. Ele não conclui que a Bíblia ensina o Conhecimento Médio, mas certamente sugere a trajetória que apoia sua doutrina do Conhecimento Médio. A solução do problema, ele afirma, é deixada para a teologia filosófica (ibid, p.125)
Craig equaciona a visão Determinista Reformada com o Fatalismo (ibidem, p. 126). O fundamento de seu argumento não declarado de imediato é, em última análise, o mesmo argumento usado por todos os proponentes do libertarianismo libertário; ou seja, que se estivermos corretos em nossa visão, inevitavelmente fazemos Deus o autor do pecado, desde que foi ele quem moveu Judas, por exemplo, a trair o Cristo, uma cena que premiou o infeliz judeu com a perdição eterna. Mas, como pode um Deus santo levar pessoas a cometer males morais e, além disso, como pode essas pessoas então serem consideradas moralmente responsáveis pelos atos sobre os quais elas não tinham controle? A visão Agostino-Calvinista parece, de fato, transformar Deus no diabo (ibidem, p. 135)
Craig argumenta que certeza não é igual a necessidade. Sua verdade é que ele pode pensar em pessoas que estão seguras, mas erradas.  A fim de excluir ações contingentes futuras pelos agentes livres do conhecimento natural, ele argumenta que o futuro não é completo para Deus; eventos naturalmente ou livremente ativados (ele realmente iguala esses)(ibidem, p.131)
Ele distingue entre uma descrição “perceptualista” do conhecimento divino e um modelo “conceitualista”(ibidem, p. 133). O modelo perceptualista é “implicitamente assumido quando uma pessoa fala de Deus tendo ‘previsto’ o futuro ou tendo ‘previsão’ dos eventos futuros” (ibidem). O “modelo percepualista da cognição divina é executado em problemas reais quando se trata do conhecimento de Deus do futuro, desde que eventos futuros não existem, não existe nada para se perceber”(ibidem). O modelo conceitualista opera melhor porque não é baseado no fato de Deus “olhar o futuro”, que é um “antropomorfismo terrível”(nunca esqueça que a Bíblia é cheia de tais “antropomorfismos terríveis”) além de seu conhecimento ser como ideias inatas; ele conhece as verdades sobre eventos futuros, mesmo que ele não saiba exatamente quais serão esses eventos futuros.
Assim, Dr. Craig entende a doutrina bíblica incluindo o conhecimento médio. Que ele diz fazer perfeito sentido do controle providencial de Deus sobre um mundo de agentes livres (ibid, p134). Ele reconhece que existem passagens bíblicas que ensinam uma “espantosa afirmação da soberania divina sobre os assuntos humanos”. Ele menciona que a crucificação “aconteceu pelo plano de Deus baseado em sua presciência e pré-ordenação”(ibid, p. 134), mas ele redefine presciência como Conhecimento Médio. Craig apela para 1 Coríntios 2.8 e sugere que isso significa que Deus dispôs as circunstâncias de tal forma que os agentes livres fariam o que eles fizeram, mas que Deus não controlou diretamente suas ações.
De tudo que posso dizer, digo que as questões não mudaram fundamentalmente desde o final do século 16 e início do século 17. Os neo-evangélicos que defendem o Conhecimento Médio simplesmente o fazem sem referências à crítica ortodoxa reformada. Mesmo que tenha certeza que a situação seja mais diferente do que parece, o resumo de Craig da discussão pós-reforma não parece ser bem informada sobre a ortodoxia reformada. Sua leitura parece centralizar-se em Molina e Suarez. Ele então limita a definição do conhecimento natural com a excluir os contrafactuais. Isto parece como uma definição que serve a si, necessária ao Conhecimento Médio. Os Reformados definem Conhecimento Natural de modo a eliminar a necessidade do Conhecimento Médio. Nós temos a doutrina do concursus, segundo a qual se diz que Deus trabalha através das “decisões das criaturas livres”, de modo que não é necessário recorrer ao Conhecimento Médio.

As considerações do Craig sobre conhecimento divino parecem tingidas com o racionalismo. Isto é evidente quando ele apela para a noção de viabilidades. “Viável” é uma palavra pesada. Quem pode dizer o que é “viável” para Deus? Isto me parece como o argumento da “adequação” de Anselmo (que Deus faz apenas o que é adequado). É bacana se Deus chegasse e dissesse (e, então nos revelasse) o que é e o que não é “viável” ou “adequado”, mas não se estivermos dando a definição. Craig, no entanto, não começa com a revelação. Ele estabelece um a priori, pelo qual ele aproveita a Escritura, pelo qual ele condena o Agostinianismo. É que verdade que a visão Agostiniana de Deus cria dificuldades reais. O mesmo acontece com a doutrina da Trindade e com a doutrina das Duas Naturezas de Cristo. A Cruz de Cristo é um escândalo, e a visão de Craig tende a atenuar o escândalo, o que é escandaloso!

Sua exegese bíblica é mais bem descrita como desajeitada. Ele não parece reconhecer que nas Escrituras sua varias formas de discursos, incluindo o discurso coloquial, hipérbole e outras formas comuns de discurso. Isto é especialmente bizarro, dado o fato de que Craig apela para a linguagem ordinária para apoiar suas posições.
Ironicamente, Craig acusa o Teísmo Aberto de não ser guiado pela exegese, mas pela filosofia (ibid, p. 126). Poderíamos acusá-lo do mesmo pecado com alguma justificação. Ele não oferece nenhuma discussão em passagens como Efésios 1, Romanos 9, Êxodo 9 ou em muitos outros textos bíblicos fortemente deterministas. Parece-me que se eu posso encontrar um caso de uma determinação divina de agentes livres, então o Conhecimento Médio falha, e afirmamos que existem dezenas de casos tais casos explicitamente revelados nas Escrituras. Ao tomar as certezas humanas e divinas como unívocas, Craig nos lembra de que os mais sofisticado filósofos cristãos podem cometer erros teológicos básicos. Não somos Deus e Deus não é uma criatura. Eu não consigo pensar em todos de coisas, mas não estamos falando sobre o que eu posso ou não conhecer, mas sobre o que como Deus conhece e o que ele conhece.
O argumento de que o modelo perceptualista falha porque eventos futuros não existem e não podem ser percebidos, falha porque pressupõe que o futuro não existe na mente divina. Esta é uma hipótese falsa de como os teólogos entendem as Escrituras. Nós vemos que a Escritura ensina que os futuros existem no presente para Deus e Deus tem, desde toda a eternidade e esse conhecimento naturalmente.
A crítica tradicional é dupla. Primeiro, o Conhecimento Médio destrói a divina simplicidade. Simplicidade é uma doutrinal católica e bíblica, e não uma peculiaridade Reformada (Deut. 6.4). Qualquer coisa que faça Deus dependente de seres contingentes, nega a simplicidades. De acordo com o Conhecimento Médio, Deus não é o que ele é, mas ele é o que vem a ser.
Voetius argument:
A partir dos pontos que até agora têm sido defendidos contra o Conhecimento Médio, está claro que a inteira dificuldade na presente controvérsia reduz a este único ponto: poderiam as coisas livres condicionadas, desde a eternidade indiferente pela natureza da futurição ou não-futurição, ter passado para o estado de um acontecimento futuro, exceto pelo decreto divino? Este é o fundamento dos fundamentos, sobre o qual todo o peso do caso repousa. Este é aquele postulado que não podemos conceder aos nossos adversários e eles não podem nos provar... O Conhecimento Médio é eficaz e congruente para qualquer fim, pela sua natureza. Sobre isso, Deus é obrigado a esperar na sábia elaboração de seus decretos, limitados a ter um resultado fixo. A verdade ou falsidade do futuro livre condicionado de alguém não é conhecido a partir de suas causas ou dos decretos divino, mas  da ocorrência real da criatura. Antes de cada ato de sua livre vontade, Deus pode ver certeza nas coisas bastante incertas por sua natureza. Resumindo, existem ens independentes do supremo ens(Veja Heppe’s Reformed Dogmatics, 80ff)

Então, a coisa principal é que para Deus não pode haver possibilidade ou objeto do conhecimento que preceda seu decreto e seja independente dele.
O importante teólogo bíblico (e sistemático) reformado Johannes Cocceius concluiu, acerca do Conhecimento Médio, que ele reduz Deus a um “Júpiter Homérico que consulta a sorte” (Summa theologiae 10 §33; veja também VanAsselt, The Federal Theology of Johannes Cocceius, 167–8, n. 28). Um segundo problema foi destacado por Turrentin (Terceiro Tópico, Pergunta 13, Parágrafo 1[1]) que argumenta que em Deus existe apenas um conhecimento necessário, fundamentado na natureza divina, e um conhecimento livre pelo qual Deus conhece o que realmente existe por causa de sua vontade (assim, “livre” porque é voluntária). Ensinar que existe um Conhecimento Médio que depende da liberdade das criaturas é apoiar o sinergismo, que é contrário às Escrituras. Se Deus conhece apenas hipoteticamente, então nossas escolhas tornam-se essenciais para salvação. A Escritura ensina que nossa escolha não é essencial para a salvação. Deus predestinou Jacó e Esaú antes que um ou outro tivesse feito bem ou mal, a fim de que o Decreto de Deus permanecesse.

O Conhecimento Médio é atrativo porque parece conceder a soberania divina e a liberdade humana de uma forma que ou suprime ou atenua o problema do mistério e da aparente injustiça. A Teologia Reformada está satisfeita com o mistério como ele é apresentado na Escritura e satisfeita como a Justiça de Deus. Nós dizemos que Deus é soberano e que nós somos altamente responsabilizados moralmente por nossas ações não forçadas. Nós fazemos o que Deus tem conhecido e decretado desde toda eternidade e, ainda assim, somos moralmente responsáveis pelo que fazemos. Como pode ser isso? Eu não sei. Leia Romanos 9.19 – 21. Evidentemente Paulo sentiu a força do mistério da divina soberania e responsabilidade humana, mas não sentiu-se compelido tentar resolvê-las:

“Dir-me-ás então: Por que se queixa ele ainda? Porquanto, quem tem resistido à sua vontade? Mas, ó homem, quem és tu, que a Deus replicas? Porventura a coisa formada dirá ao que a formou: Por que me fizeste assim? Ou não tem o oleiro poder sobre o barro, para da mesma massa fazer um vaso para honra e outro para desonra?”

Tivesse Paulo crido ou ensinado o Conhecimento Médio, este teria sido o lugar perfeito para ensiná-lo. Tivesse Molina escrito esta passagem, ele nunca teria nos dito para emudecermos! Molina teria nos dito que somos criaturas livres e que Deus é ou tem desejado ser subordinado às nossas ações. Claro, Paulo não pensa tal coisa.
Paulo está apenas ecoando o que ele tinha aprendido de Jó. De toda a aparente injustiça e muitos danos reais que ele sofreu, Jó finalmente desafiou a Deus a explicar-se para ele. Aqui está a resposta de Deus a Jó:
Onde estavas tu, quando eu fundava a terra? Faze-mo saber, se tens inteligência(Jó 38:4)

No fim do dia, não podemos desafiar a justiça de Deus ou sua sabedoria ou caminhos porque nós não somos competentes para fazê-lo. Seu conhecimento transcende absolutamente nossa habilidade de entender (Is 55.8). Nós somos e devemos ser agradecidos em tudo pelo que Deus tem revelado de si e, salvadoramente na Palavra, Deus o Filho, Jesus Cristo (Ef. 1.9). Nele nós encontramos toda resolução suficiente dos mistérios de Deus.
Fonte: http://heidelblog.net/2010/04/molinism-and-westminster-seminary-california/


[1] Na edição portuguesa, vol. 1, p. 288.