Além de debates públicos, participei de várias discussões polêmicas por escrito. Um exemplo dessas discussões foi a que tive com o cientista Richard Dawkins. Embora elogiasse suas obras ateístas, eu sempre criticara sua escola de pensamento do gene egoísta.
Em meu livro Darwinian Evolution, observei que a seleção natural não produz nada positivo. Apenas elimina, ou tende a eliminar, tudo o que não seja competitivo. Uma variação não precisa ter nenhuma real vantagem competitiva para evitar a eliminação. É suficiente que não sobrecarregue seu portador com uma desvantagem competitiva. Para usar uma ilustração bastante tola, vamos supor que eu tenha asas inúteis dobradas sob meu paletó, asas frágeis demais para me erguer do chão. Sendo inúteis, elas não me ajudam a escapar de predadores, nem a buscar alimento. Mas, como também não me deixam mais vulnerável a predadores, eu provavelmente sobreviverei para reproduzir e passar minhas asas a meus descendentes. O erro de Darwin, ao expor uma inferência demasia¬damente positiva com sua sugestão de que a seleção natural produz alguma coisa, foi, talvez, devido ao emprego que ele fez de expressões como "seleção natural" ou "sobrevivência dos mais aptos", em vez de sua própria e preferida "preservação natural".
Observei que O gene egoísta de Dawkins era um grande exercício de mistificação popular. Como filósofo ateísta, eu considerava esse trabalho de popularização tão destrutivo quanto O macaco nu ou A fauna humana, de Desmond Morris. Em suas obras, Morris oferece, como resultado de conhecimento zoológico, uma negação sistemática de tudo o que é mais peculiar a nossa espécie, vista como fenômeno biológico. Ele ignora as óbvias di¬ferenças entre os seres humanos e as outras espécies, não dando explicações para elas.
Dawkins, por outro lado, batalhou para diminuir ou depreciar o resultado de cinqüenta ou mais anos de trabalho em genética: a descoberta de que as características observáveis de organismos são, na maior parte, condicionadas pelas interações de muitos genes, enquanto a maioria dos genes tem múltiplos efeitos sobre muitas dessas características. Para Dawkins, o principal meio de produzir comportamento humano é atribuir aos genes características que possam, de modo significativo, ser atribuídas apenas a pessoas. Então, depois de insistir em que todos nós somos criaturas de nossos genes, e que nisso não temos escolha, ele sugere que não podemos fazer outra coisa a não ser aceitar as características pessoais desagradáveis daquelas mônadas que tudo controlam.
Os genes, naturalmente, não podem ser egoístas, nem altruístas, assim como nenhuma outra entidade sem consciência pode envolver-se em competição ou fazer seleções. Seleção natural é, notoriamente, não-seleção, e um fato lógico, um pouco menos conhecido, é o de que, abaixo do nível humano, a luta pela existência não é "competitiva" no verdadeiro sentido da palavra. Mas isso não impede Dawkins de proclamar que seu livro "não é ficção científica, mas ciência. Somos máquinas de sobrevivência, veículos robôs cegamente programados para pre-servar as moléculas egoístas conhecidas como genes". Embora mais tarde divulgasse algumas ocasionais retratações, Dawkins não emitiu nenhum aviso, indicando que suas palavras não deviam ser tomadas literalmente. E acrescentou, de modo sensacionalista, que "o argumento deste livro é que nós, e todos os outros animais, somos máquinas criadas por nossos genes".
Se alguma coisa disso tudo fosse verdadeira, seria inútil, como Dawkins faz, continuar a pregar: 'Tentemos ensinar generosidade e altruísmo, porque todos nós nascemos egoístas". Não há eloqüência que possa mudar robôs programados. Mas não há verdade em nada disso, nem mesmo um mínimo de sensatez. Os genes, como temos visto, não comandam, nem podem comandar, nos¬sa conduta. Tampouco têm a capacidade de calcular ne¬cessária para traçarem uma rota de implacável egoísmo ou de altruísmo sacrificial.
Fonte: FLEW, Antony. Um Ateu Garante: Deus Existe! São Paulo: Ed. Ediouro, 2008.
Fonte: FLEW, Antony. Um Ateu Garante: Deus Existe! São Paulo: Ed. Ediouro, 2008.
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