segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Exposição em Marcos 1. 2 - 8

Abaixo segue-se uma exposição minha publicada no site Teologia Brasileira. Agradeço aos editores daquele site a publicação. Esta exposição segue a primeira feita em Marcos 1.1, que você pode acessar aqui
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A PROMESSA E CUMPRIMENTO DO EVANGELHO ETERNO


Introdução

O Evangelho não é um improviso da parte de Deus para um plano que não deu certo. Pelo contrário, o Evangelho é o único plano de Deus e isto fica claro nos versos de Marcos 1. 2 – 8. Porém, o Evangelho requer uma resposta. Esta resposta é chamada arrependimento. Não é apenas uma confissão verbal de que se “aceitou a Jesus Cristo”, mas uma confissão e abandono de pecados. O Evangelho promove uma mudança interior, pois aquele que faz a mudança está plenamente envolvido no Evangelho: o Espírito Santo.

Esboço Expositivo

O Evangelho de Cristo Jesus, o Evangelho do Arrependimento
A Promessa do Evangelho (vv. 1 – 3) – O Evangelho é a promessa de Deus feita no Éden (Gn 3.15) e mantida através da Aliança de Deus revelada a Noé, Abraão, Moisés, Davi e Jesus Cristo. Foi revelado no tempo, embora seja eterno. É cumprimento de profecia. Marcos entende isto ao apelar para os profetas do Antigo Testamento. Isto é deveras importante para reafirmar que uma verdadeira compreensão do ministério de Jesus Cristo passa pelo conhecimento do Antigo Testamento.

Vejam como ele começa: “Como está escrito nos profetas”1 . Leiam Êx 23.20; Is 40. 3 e Ml 3.1. O que você encontra? Que a preparação para vinda do Messias foi prenunciada. Marcos reúne as três citações, pois todas elas têm em comum o termo “caminho”. Cada uma, a começar por Êxodo, retoma a outra. Isto é lembrança das promessas de Deus, para enfatizar que aquele que viria seria o Messias de Deus, o Prometido.

Existem cerca de 465 textos do Antigo Testamento que se referem diretamente a Jesus Cristo. Aqui temos apenas três referentes ao Precursor de Jesus, João Batista. O que deveria fazer o Precursor? “Preparar, no deserto, a chegada do Senhor”. No Antigo Testamento, o deserto era onde Deus encontrava o seu povo. O Evangelho eterno adentra o tempo e começa no deserto. É o anúncio de um novo êxodo, uma nova libertação!

O Pregador do Evangelho (vv. 4a, 6, 8) – João Batista aparece no lugar mais inusitado. Deixe-me dizer que o pregador do Evangelho é alguém a quem Deus destina para tal ofício. Leia-se em Mt 3. 3 e Lc 3.2. Como aqui em Marcos, ambos indicam que João foi chamado para tal missão. Há um caráter profético no pregador do Evangelho: ele é levantado por Deus para anunciar a Palavra de Deus e ele surge nos lugares menos esperados. Permita-me dizer que este talvez seja o porquê termos tão pouco verdadeiro evangelho em nossos dias. Porque muitos estão se apresentando para pregar o Evangelho sem nunca terem sido chamados para isso! Isto é chamado de “Comissão” e é algo sério, pois trata-se de anunciar a Palavra de Deus.

João em nada se parecia com os “pregadores” da Teologia da Prosperidade hoje. A descrição de Marcos sobre João é extremamente assombrosa. Por que Marcos fala sobre a aparência de João? Há um lado profético nisto. Sabia-se, à luz da profecia, que antes da vinda do Cristo, Elias deveria aparecer (Ml 4. 5, 6; Mt 11. 14; Cf. 2 Rs 1.8). Não é que João Batista fosse reencarnação de Elias, mas sim, que teria ministério semelhante.2 O outro lado é que João em nada se parecia com os doutores da Lei e fariseus e, assim, o que João tinha a dizer era mais importante do que ele mesmo. O Evangelho é mais importante do que qualquer personalidade do pregador!

A Mensagem do Evangelho (vv. 4b, 7, 8) A mensagem que João anunciava causou agitação em Israel. Uma multidão foi atraída para ouvi-lo pregar (Mt 3. 5; Lc 3.7). O que atraiu tanta gente? Ele não tinha boa aparência e não estava parado num ponto; ele percorreu toda a terra em redor do Jordão (Lc 3. 3). Será que João promoveu uma boa festa para atrair as multidões? Talvez João tenha promovido um “louvorzão” ou, quem sabe tenha feito uma “campanha evangelística com muitas bandas e ‘pregadores’ light e boa-praça”. Quem sabe prometeu bênçãos, riquezas, saúde, curas e resolução dos problemas daquelas pessoas! Nada disso! João pregava.3 Não fiquem surpresos se ao compararem a mensagem que João Batista anunciou perceberem que em nada se assemelha com as muitas mensagens de hoje. Vamos destacar o conteúdo da mensagem de João:

a. João pregava arrependimento – pelo uso do particípio presente, entende-se que esta a mensagem de João. O texto diz que ele pregava “o batismo de arrependimento, para remissão de pecados”. Não é que o batismo provocasse o arrependimento. Pelo contrário, João batizava em relação ao arrependimento. Mateus afirma que João exortava às multidões a arrependerem-se (Mt 3. 2); e Lucas descreve que ele exortava ao povo para que produzissem frutos, ou seja, que demonstrassem que estavam, de fato, arrependidos (Lc 3.8; Mt 3.8). Não há arrependimento quando não se abandona o pecado. Não há remissão (perdão) de pecado sem arrependimento. A Confissão de Fé de Westminster (XV, § 2, 3) descreve isto dizendo: “Movido pelo reconhecimento e sentimento, não só do perigo, mas também da impureza e odiosidade do pecado como contrários à santa natureza e justa lei de Deus; apreendendo a misericórdia divina manifestada em Cristo aos que são penitentes, o pecador pelo arrependimento, de tal maneira sente e aborrece os seus pecados, que, deixando-os, se volta para Deus, tencionando e procurando andar com ele em todos os caminhos dos seus mandamentos”. E que o arrependimento “é de tal modo necessário aos pecadores, que sem ele ninguém poderá esperar o perdão”. Ora, é exatamente isto que vemos aqui no texto bíblico e nos outros evangelistas. Arrependimento não é apenas uma confissão verbal de um ato interior, mas aparece nos atos externos também. Ah, quão longe desta mensagem tem sido as “preleções” dos supostos pregadores. Não exortam aos homens a arrependerem-se de seus pecados, a abandoná-los; a produzirem frutos que demonstrem arrependimento etc.

b. João pregava a Glória de Jesus Cristo – Este é outro ponto da pregação de João. Aprendi certa vez que o verdadeiro pregador é como um holofote de edifício. Ele ilumina a beleza do edifício. Ninguém admira o holofote, mas o edifício a quem o holofote ilumina. Vemos isso no ministério de João Batista. Ele diminuiu para que Cristo crescesse (Jo 3. 30), exaltando a figura daquele que era o centro das suas pregações. Até mesmo quando os discípulos de João e os judeus, quando estes tentaram lançar João contra Jesus, João disse que alegrava-se em ser a “voz do noivo”, e não o noivo (Cf. Jo 3. 26 – 36). Na exaltação da glória do Messias, João ensina que não há Evangelho sem a exaltação Daquele que é o centro do Evangelho. João assim tinha que fazer pois o que viria não era mais um dentre os judeus; antes era o Filho de Deus (Jo 2. 34), o “mais poderosos” que João (Mt 3.11; Lc 3. 16), do qual João não era digno nem de desamarrar os cadarços dos chinelos do Messias. João era um Arauto4 , isto é, anunciava como porta-voz, a mensagem do seu Senhor; não falava em nome de si mesmo, mas do seu Senhor. Então, era o seu Senhor que deveria ser exaltado. Parece-me tão diferente dos nossos dias, nos quais os holofotes iluminam uns aos outros e deixam o edifício na escuridão.

c. João pregava a Obra de Jesus Cristo – veja sobre o que João pregava: “Eu, em verdade, tenho-vos batizado com água; ele, porém, vos batizará com o Espírito Santo”(v. 8). Marcos é breve no seu evangelho. Porém, os outros evangelistas apresentam a íntegra do discurso de João Batista (Mt 3. 11, 12; Lc. 3. 16, 17). Ele divide apresenta a obra de Jesus Cristo em três aspectos:
1.Na Regeneração do Pecador – João diz que Cristo faria o verdadeiro batismo: o com o Espírito Santo. Notem que o agente do Batismo é Jesus Cristo. Enquanto o batismo de João era com água, ou seja, exterior; o de Jesus Cristo era com o Espírito Santo, ou seja, no interior. Esta obra está associada à Regeneração (Cf. Tt 3.5).
2.No Julgamento do Ímpio – há alguns que pensam que existe um batismo “com Espírito Santo e com fogo” para os Crentes. Os Crentes, que foram selados com o Espírito Santo, segundo os Evangelistas, não serão batizados com fogo. Antes, de acordo com Mt e Lc, o “com fogo” está reservado para os impenitentes, incluindo os fariseus e saduceus (Mt 3. 7; Lc. 3. 7). Notem a parábola contada por João (Mt 3. 10, 12; Lc 3.9, 17). O batismo do Espírito Santo é para o trigo, a boa árvore; e o fogo é para a palha, a má árvore.
Talvez alguém pense: como isso pode fazer parte da obra de Cristo? Sim, salvar pecadores e julgar os não convertidos é mensagem do Evangelho, visto que trata da relação entre Deus e Homem e como Deus encontra este Homem, em seus delitos, rebeldia e em pecados. A mensagem do Evangelho, como o “bom perfume de Cristo”, pode ser cheiro de morte ou de vida. Para os que são salvos, cheiro de vida para a vida; para os que se perdem, cheiro de morte para morte (Cf. 2 Co 2. 14 – 17). A mensagem de João Batista é que Jesus Cristo tem um “machado à mão” e este machado está posto à raiz das árvores. Tem, também, nas mãos, uma “pá”, com a qual separa o trigo do joio. Ambos com destinos diferentes: a árvore boa com bons frutos e o trigo são recolhidos no Celeiro Celestial; a árvore má e o joio lançados ao fogo que nunca se apaga. Esta mensagem de João nos conduz ao último ponto e a uma pergunta: qual a resposta esperada, então?

A Resposta ao Evangelho (vv. 5c. Cf. Mt 3. 6 – 12; Lc 3.10 – 18) – aqui em Marcos temos uma resposta. Em Marcos o resumo é que muitos vinham “confessando os seus pecados” (v. 5c). A confissão é um testemunho do arrependimento. Eu preciso dizer que não é a filiação religiosa de alguém que o conduzirá ao reino dos céus. Daquela multidão, muitos diziam ser “filhos de Abraão”(Mt 3.9), mas Deus poderia fazer de pedras filhos de Abraão. Nem mesmo o batismo com água pode garantir a alguém o perdão dos pecados. Apenas a sincera confissão de pecados e o abandono dos mesmos garantem o perdão dos pecados. Que isto é assim basta olhar para os outros evangelistas, nas passagens paralelas. Em Lucas, por exemplo, muitos a faziam a pergunta-chave: “que faremos, pois?”(Lc. 3. 10, 12, 14) e Lucas mostra como deveriam demonstrar que suas confissões eram verdadeiras em seus arrependimentos: tendo uma vida que pautada pela ética cristã! Ou seja, se haviam confessado seus pecados, se estavam arrependidos, então dariam provas disto com seus atos.

Não há, portanto, confissão sem abandono dos pecados e mudança de hábito. Como você tem respondido ao Evangelho de Jesus Cristo?

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NOTAS

1 A ARA tem “como está escrito na profecia de Isaías”. A leitura “nos profetas” possui melhor atestação não apenas nos manuscritos, mas no contexto, visto que há dois profetas, mais a citação de Moisés, citados por Marcos.
2 Ambos apareceram repentinamente no deserto; vestiam-se de modo semelhante; repreenderam reis e foram perseguidos por mulheres más; sofreram momentos de desânimo.
3 Duas vezes aparece o verbo “pregar”. O primeiro aparece no particípio presente; o outro no indicativo imperfeito. Era o que João fazia no passado e estava fazendo no presente: pregando o Evangelho.
4 É isto que o verbo khru,ssw quer dizer: arauto


Fonte: Teologia Brasileira

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