NOTA: O texto é longo e sem imagens. Fui orientado a resumir o texto, mas não tenho o dom da síntese. Refiz algumas coisas e agradeço sinceramente ao Franklin pelas sugestões. Trata-se de uma resposta a dois amigos: um filósofo e outro historiador. Ambos presbiterianos. É sinal de um sintoma de longas décadas de doutrinação marxista-desconstrucionista-gramsciana. Por providência, fui logo vacinado, logo quando o "recontar da história" começou a atingir-me. Os textos de centenas de mestres (Prof. Olavo de Carvalho, Dr. Abraham Kuyper, Dr. Dooyeweerd, João Calvino , Schaeffer, documentos do período chamado "Ditadura Militar", Jornais antigos e de tantos outros textos e autores) vieram ao meu encontro e preservaram-me do ludíbrio historiográfico contado pelos que hoje estão no Poder, bem como livrou-me da dicotomização radical da vida. Vamos ao texto.
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Por Gaspar de Souza
Por Gaspar de Souza
1. Tendo passado o primeiro turno das eleições, ficou-se a nítida impressão de que o Brasil ainda não quer ficar todo vermelho. Milhares de brasileiros mandaram seus recados aos institutos de pesquisas, estes “seres olímpicos”, cuja sapiência hérmica interpreta para os mortais as intenções de votos do “povo”, esse ente metafísico.
2. Dois amigos meus, cristãos e líderes, um formado em História e outro em Filosofia, vez por outra travam embates políticos comigo (ou eu com eles, claro). Mas, o que me irrita mesmo é o senso de “neutralidade historiográfica” ou, como o amigo filósofo escreveu, que deveríamos fazer política “de forma imparcial”, esquecendo que já optam por uma forma ou outra de parcialidade conceitual. Os dois incorrem em erro básico e deveriam estar cientes deste erro: todo posicionamento acerca de qualquer outra área do saber existe numa relação hermenêutica sujeito-objeto mediada por uma pré-compreensão daquilo que se deseja interpretar. Num tom mais heideggeriano “a interpretação sempre se funda numa visão prévia, que ‘recorta’ o que foi assumido na posição prévia, segundo uma possibilidade determinada de interpretação”(Ser e Tempo, § 32). Isto também se aplica à História. O amigo historiador, doutrinado na dialética matério-hegeliano-marxista de eventos tipo causa-e-efeito, esquece-se de que suas concepções acerca da história estão arraigadas num background filosófico e, em última instância, epistêmico-metafísico. Diz o professor Murray G. Murphey (Truth and History, 2009, p. 4, 5):
A maioria dos historiadores considera as interpretações alternativas dos dados simplesmente como um fato da vida. Esta convicção assenta-se no fato de que o corpo de dados sobre qualquer questão histórica é limitada e que, ao contrário das ciências naturais, os historiadores não podem expandir sua base de dados à vontade. Dado todo o corpo, dados finitos fixos, é sempre possível inventar teorias alternativas que podem explicar aqueles dados. Mas isso não significa que essas teorias alternativas sejam igualmente boas para explicar os novos dados à medida que são descobertos.
Em outras palavras, meu amigo historiador escolherá os dados mais ajustáveis às suas pressuposições, podendo inventar teorias que, possivelmente, pudessem explicar seus “fatos”. Enfim, quando meus amigos pedem para que sejamos “parciais” ou procuram analisar a história como observadores neutros, já se tornaram parciais e subjetivistas. Não há campo neutro, não há dados neutros, não há história completa e não há política que não possua fundamento religioso, seja a favor de Deus ou contra Deus. Aos pontos apresentados por meus amigos, quando falam em nome da laicidade do estado, optam por um estado anti-religioso, visto ser impossível um estado a-religioso. Meus amigos contribuem maciçamente para a dicotomia público-privado.
3. Um deles diz que nem a esquerda entende os evangélicos, nem os evangélicos entendem a esquerda. Estes seriam ignorantes porque “vêem a questão social pela ótica da guerra fria e entendem temas como família apenas pelo viés moral”. Aqueles vêem estes apenas por “questões materiais”. Esperar-se-ia que a ‘esquerda’ fosse avaliada, mas, para surpresa, apenas os evangélicos e seus fundamentos teóricos acerca da família serão questionado. Para o articulista, os temas morais que os evangélicos debatem, além de reducionistas, estão longe do verdadeiro problema: moradia, trabalho, emprego, educação etc. Claro que estes temas “tocam à (sic) organização e estruturação da família”. Porém, como cristão calvinista, o articulista deveria olhar estes temas à luz da cosmovisão cristã. A menos que o nobre historiador não acredite que esta disciplina tenha algo a dizer.
4. O nobre escritor (e me espantou que o meu amigo filósofo usou o mesmo argumento da estrutura econômica para defender o PT e ser contra os evangélicos) deveria lembrar que ambos os temas estão associados e que, como na época do Rei Uzias, que reinou durante 55 anos em Israel, Judá muito prosperou (Cf. 2Cro 26. 1 – 15), mas veio a se orgulhar por tudo isso (2Cr 26. 16ss); esquecem-se do Rei Jeroboão II (825 e 784 a.C.), filho de Joás, e que se tornou o maior líder de Israel, Reino do Norte, governando por 41 anos. O Reino do Norte alcançou a “Idade de Ouro”(cf. II Rs 14. 23 – 29). Havia paz entre as nações e enriquecimento das pessoas. As relações internacionais estavam indo de vento em popa. As pessoas estavam prosperando economicamente; o comércio prosperava (Am. 8.5); a classe média expandia-se (Am. 4. 1 – 3), casas luxuosas estavam sendo construídas (Am. 3.15; 5.11; 6. 4, 11); os ricos estavam tranqüilos (Am. 6. 1 – 6). Esta época do Profeta Amós (séc. VIII a.C) ficou conhecida como “a época áurea de Israel e de Judá”. Mas havia um caos político, Moral e Religioso. Isto não estava patente ao povo dos Reinos do Norte (Israel) e do Sul (Judá), visto que era um período de prosperidade sem precedente. Porém, a despeito disso tudo, Israel e Judá estavam em terríveis pecados. Os pobres eram privados em seus direitos básicos (Am. 2. 6, 7 [liberdade – escravidão]; 5.7, 10 – 13[altos impostos]; 6. 12 [corrupção da justiça]; 8. 4 – 6 [opressão]); os endividados eram aceitos como escravos (2.6; 8.6. Cf Lv 25. 39; Dt 24. 12, 13); a imoralidade era a regra (Am. 2. 7). Ainda assim, a Religião e a Política econômica estavam em pleno desenvolvimento e atividade (Am. 4.4; 5.5; 8.3, 10). Qualquer semelhança com o Brasil não é mera coincidência.
5. Desta análise, conclui-se que os temas listados pelos interlocutores (moradia, trabalho, emprego, educação etc) e a melhoria de “muitos miseráveis” (palavras do amigo filósofo), não passam apenas pelo viés político-econômico; antes passam, sim, na base, no fundamento, da ética – se quiserem aprofundar a questão, podemos falar que a ética é reflexo de uma concepção epistemológica – sendo assim, devendo o Cristão protestar não apenas contra o aborto, união civil do mesmo sexo, contra prostituição etc, mas principalmente pelo fundamento deontológico dos políticos, quando estes oferecem moradia, trabalho, emprego, educação etc. às custas de valores éticos mais importantes. Portanto, a “discussão de temas” deve ser avaliada à luz do que pensam os políticos em termos morais, sim. E são os temas morais que destroem muito mais, como atesta o Livro do Profeta Amós (a menos que meus interlocutores não consideram a revelação naquele livro, claro).
6. Agora, isto me leva ao segundo ponto que meus interlocutores apresentam. Primeiramente, o meu amigo filósofo afirma que os “líderes evangélicos” deixem de ser “tutor de suas ovelhas”. Nada mais destoado da teologia calvinista do que isso. Ora, de acordo com o Apóstolo Paulo, o magistrado “é ministro de Deus”(Rm 13.1 – 4), tanto quanto um pastor é ministro da Palavra. A diferença entre os dois é o “poder da espada” (linguagem da Confissão de Fé de Westminster – cap. 23, § i) quem ambos trazem. No primeiro, o poder da espada é temporal, usada para “castigo dos malfeitores e incentivo e benefício dos bons” e tudo isso visando a “glória de Deus e para o bem público” (idem). Este não pode tomar sobre si a “administração da palavra, dos sacramentos ou o poder das chaves do Reino do Céu, nem de modo algum intervir em matéria de fé; contudo, como pais solícitos, devem proteger a Igreja do nosso comum Senhor, sem dar preferência a qualquer denominação cristã sobre as outras, para que todos os eclesiásticos sem distinção gozem plena, livre e indisputada liberdade de cumprir todas as partes das suas sagradas funções, sem violência ou perigo. Como Jesus Cristo constituiu em sua Igreja um governo regular e uma disciplina, nenhuma lei de qualquer Estado deve proibir, impedir ou embaraçar o seu devido exercício entre os membros voluntários de qualquer denominação cristã, segundo a profissão e crença de cada uma”(CFW, cap. 23, § iii).
Neste ponto, já esta citação seria suficiente para que o meu amigo historiador percebesse que, pelo menos entre os calvinistas, não há “algum grau de dificuldade na relação com o estado laico”. As palavras da CFW são um primor da democracia. O problema é que o estado atual, eivado de materialismo-histórico-gramsciano, quer colocar a igreja sob sua tutela separando as coisas em “isto é política, não religião”, isolando a religião do debate político. Então, ao invés de termos um estado laico, temos um estado anti-religioso. Tratam de temas da ética, da moral e da religião religiosamente implícito na política. Nas palavras de Kuyper: “Nenhum esquema político jamais se tornou dominante a menos que tenha sido fundado numa concepção religiosa específica ou numa concepção anti-religiosa”.
7. Já os “ministros da Palavra” têm o poder eclesiástico da espada, sendo o “governo da igreja” diferente da magistratura civil. Ainda citando a CFW (cap. 30, § ii), a estes foram entregues “as chaves do Reino do Céu. Em virtude disso eles têm respectivamente o poder de reter ou remitir pecados; fechar esse reino a impenitentes, tanto pela palavra como pelas censuras; abri-lo aos pecadores penitentes, pelo ministério do Evangelho e pela absolvição das censuras, quando as circunstâncias o exigirem”.
8. O que isto tem a ver com o fato dos pastores e padres alertarem suas ovelhas a não escolherem certos candidatos ao governo? Ora, estes futuros ministros serão pastores da Nação, e se o pastor eclesiástico, quando “vê vir o lobo, e deixa as ovelhas, e foge; e o lobo as arrebata e dispersa as ovelhas”, não passará de um mercenário, visto não ter “cuidado das ovelhas” (Cf. Jo 10. 12, 13). A igreja, como instituição e organização é apartidária. Ela não tem um candidato, um partido, uma ideologia política, uma bandeira governamental etc. O púlpito não é lugar para promover candidato, mas para afirmar e orientar o rebanho não apenas sobre o reino dos Céus, mas sobre o Reino de César.
9. Não exercendo este ministério holisticamente, podemos negligenciar a dádiva divina de um governo democrático como representantes sérios e vocacionados. Nas palavras de Calvino, citadas em Abraham Kuyper: “E vós, Ó povos, a quem Deus deu a liberdade de escolher seus próprios magistrados, cuidem-se de não se privarem deste favor, elegendo para a posição de mais alta honra, patifes e inimigos de Deus.” (2002, p. 91).
10. Fica claro que são os nobres colegas que estão distantes dos pensamentos biblíco-reformado-calvinista. Os pastores e padres devem, sim, orientar e alerta suas ovelhas acerca dos lobos que estão em todos os partidos. Não, há, caro filósofo, “partido perfeito”, nem o PSDB é o “partido de Deus”, mas os partidos mais republicano (se houver algum, claro. Cf. em Is 33.22 os “três poderes” da República) representam melhor os valores do Reino de Deus (e não estou falando de oração, sacramento, pregação etc. Estou falando de ação social, liberdades individuais, liberdade da imprensa, liberdade de expressão, autonomia da família, da igreja, propriedade, terra, economia, educação, saúde, promover meios para ascensão social etc.). Portanto, caro filósofo, parafraseando o Cristo digo: “acautelai-vos dos falsos políticos e dos políticos falsos”(Cf. Mt 7.15).
11. A discussão, então, deixa de ser pela polarização “esquerda-direita”, “guerra fria e militares” para ser guerra ideológica, trantando a política pela via positiva, ou seja, a mensagem cristã tem implicações públicas e sociais. O que temos visto, no entanto, é uma hegemonia no pensamento secularista, que cria uma hegemonia ideológica que até mesmo os protestantes aceitam. Leiam esta citação do teórico político Antonio Gramsci:
O moderno Príncipe [NA. O Partido da Classe Operária], desenvolvendo-se, subverte todo o sistema de relações intelectuais e morais, uma vez que seu desenvolvimento significa (...) que todo ato é concebido como útil ou prejudicial, como virtuoso ou criminoso, somente na medida em que tem como ponto de referência o próprio moderno Príncipe (...). O Príncipe toma o lugar, nas consciências, da divindade ou do imperativo categórico, torna-se a base de um laicismo moderno e de uma completa laicização de toda a vida e de todas as relações de costume (apud AZEVEDO, 2007. Grifos meus)
12. Lendo isto, nota-se como o PT possui esta estratégia e, meus amigos, reproduziram esta ideologia e não a perceberam. Agora, quem não está entendendo a relação igreja-estado, prezadíssimo historiador? É o que dá ser doutrinado nas Academias como se seus mestres fossem o poço da isenção ideológica. Pobres almas!
13. Não há, queridos irmãos, na ótica bíblico-calvinista, separação da “ordem privada” do “campo de ação do comportamento público”. O texto que se segue, do filósofo Criss Gousmett, nos dá conta desta falácia de “ordem privada” e “ordem pública” aceita pelos amigos, especialmente pelo historiador. O texto é longo, mas vale a pena.
Tudo que fazemos é religioso, uma vez que tudo o que fazemos resulta da nossa condição de criaturas: o fato de que Deus nos criou para um propósito específico, para cuidar e desenvolver o mundo que ele fez. E, porque estamos arraigados na dependência de Deus para nossa existência, a nossa relação mais fundamental na vida é religiosa, que governa e modela todas as coisas que fazemos, e desta raiz surgem nossas cosmovisões. Porque tudo que fazemos é moldado por nossa obediência ou rebelião contra Deus e Seu Pacto, a religião está arraigada na vida humana e todas as coisas que fazemos têm um caráter religioso. Não existe maneira de podermos manter a ideia de um mundo secular (ou seja, um mundo afastado de Deus), exceto sob a ilusão do pecado. Assim, nossas cosmovisões, nossa teologia, nossa filosofia [nossa visão da história, da política etc – NT) são formadas por nossa religião, isto é, o compromisso total do coração para o que conhecemos como Deus. Como vivemos o nosso compromisso de nosso coração em tudo o que fazemos, esta religião molda todas as coisas em que estivermos engajados: teologia, filosofia, políticas, educação, economia etc. Todas as áreas vida se encaixam porque tudo está enraizada em nossa vida religiosa. Para o Marxista somos basicamente seres econômicos; para o Freudiano somos basicamente seres reprimidos sexualmente; para o Cristão somos basicamente seres religiosos. A característica mais fundamental de tudo é a religião, isto é, a relação que temos com o que o quer que seja que chamemos de deus. Nossa cosmovisão é a expressão deste compromisso religiosos, formando a maneira pela qual nós realmente vivemos nossas vidas e, portanto, como fazemos filosofia e teologia (ou política, ou história etc – NT) e como podemos expressar a nossa religião.(GOUSMETT, 1996, p. 20, 21)
14. Enfim, no discurso escrito dos meus amigos, percebo a ingenuidade de acreditar que o problema é apenas acerca do aborto ou outras questões morais. A crítica que um deles faz a candidata Marina – percebe-se nele a “esquerda raivosa”, para usar uma frase dele acerca da “direita raivosa” – é pueril. Não considera o aspecto do todo, atribuindo a Marina, a quem chama de “Al Gore tupiniquim” – embora em outra ocasião, mais antiga, a chamou de “uma pessoa extraordinária” e uma “mulher incrível” – a culpa de não entender os evangélicos por culpa da conversão tardia e da filiação denominacional da candidata. Esqueceu-se ele dos muitos elogios, da foto com a candidata e do “evento que foi excelente” e da “aula impagável”, cuja “história pessoal dá-lhe a todo momento a legitimidade necessária a seu discurso”? Já sei! Acabou-se o sonho de “um convite para construção de novas utopias”.
15. Caro amigos, não incorram no erro de acreditar que os temas da ética não devam ser tratados. Os Cristãos querem mais, e fazem isto de modo tácito. Embora eu não concorde com o reducionismo ético, como se os problemas para os cristãos fossem apenas o aborto e os gays, meu conselho tem sido que irmos à raiz do problema: o que o PT acredita em sua ideologia, em seu pensamento fundamental que governa cada área da vida, não apenas as sociais e ambientais.
Se a vida é verdadeiramente entendida como religião, isto é, serviço a Deus em amor e obediência [ou rebelião – NT] como uma responsabilidade da criatura humana em uma situação histórica particular, então é impossível fundamentar, em categorias incontestáveis mutuamente exclusivas, a adoração e a política. [...] A autêntica adoração cristã terá significado político concreto. (Albert F. GEDRAITIS, 1972, p. 9)
16. Não me parece, caros amigos, que os cristãos desejam transformar este país numa “teocracia”(vide filósofo), nem mesmo que os pastores estejam manipulando “de forma tão grosseira”. O “caldo de cultura conservadora entre muitas lideranças” cultivam, sim, não um “sentimento anti-petista radical”(ao amigo historiador, até parece-me que você cultiva “um sentimento anti-peesedebista radical”. Viu como é fácil gerar ad hominem?), mas um senso de preocupação com questões mais nítidas (talvez seja miopia gospel) como as que vieram à pauta. Eles entendem que o que está em jogo são as questões das liberdades individuais. Sendo assim, caros amigos, preocupa-nos muito mais as questões de cunho moral, pois não haverá emprego se não houver crianças nascendo, crescendo e a geração atual envelhecer; para quem serão as universidades se a dizimação da vida e o impedimento de criar filhos e famílias fortes forem implantados? Não haverá redução de pobreza enquanto pensar-se no velho discurso de “divisão de classe”, querendo resolvê-la pelo confronto hegeliano a fim de gerar uma síntese estatal absoluta sobre ambos. Se a mortandade aumentar o extermínio e a relativização e depredação dos valores judaico-cristãos, que moral haverá para criarem-se empregos e famílias, se valerá tudo para satisfazer a natureza egoística deste ser humano caído? Aliás, prestem atenção como o Francis Schaeffer (2003, p. 13) alerta para os perigos do enfraquecimento dos valores morais, falando como a moral da Grécia e de Roma contribuiu para queda destes impérios. Ele diz que o problema fundamental está naquilo eles pensavam acerca de seus deuses.
mas seus deuses não eram grandes o bastante, porque eram finitos, limitados. Mesmo todos os deuses juntos não eram infinitos. Na verdade, os deuses do pensamento grego e romano eram muito semelhantes a homens e mulheres acima do comum, mas não essencialmente diferentes dos homens e mulheres humanos [...] Os deuses eram uma espécie de humanidade ampliada, não divindades. Como os gregos, os romanos não tinham um deus infinito. Assim sendo, eles não tinham nenhum ponto de referência suficiente, do ponto de vista intelectual; isto é, eles não tinham nada que fosse suficientemente grande ou suficientemente permanente a que pudessem prender o seu pensamento, ou a sua vida. Conseqüentemente, o seu sistema de valores não era suficientemente forte para fazê-los suportar os desafios da vida, tanto individual quanto política.
Lembra o que eu disse mais acima? É a religião de novo. E na base ideológica do PT (e de qualquer outro, como é o caso), o que se encontra é um ídolo. Por isso que suas propostas são mais radicais e eles não toleram os cristãos que não se embevecem com estas propostas. Novamente, faço minhas as palavras de Schaeffer, quando comenta o motivo dos cristãos terem sido perseguidos por Roma (idem, p. 17): “nenhuma autoridade totalitária ou Estado autoritário pode tolerar os que têm um referencial absoluto, de acordo com o qual avaliam aquele Estado e suas ações”. Aquelas coisas, portanto, terão a ver com a família, quando estas questões forem tratadas, entenderam?
17. Queridos, parem de ver as coisas de maneira fragmentada. Procurem ver o que há sob a superfície. Tratemos das questões sociais, mas não pensem que os pressupostos do PT, muito mais do que em outros partidos, são compatíveis com o Cristianismo. Ambos possuem deuses diferentes. Suas cosmovisões são mutuamente excludentes e opostas e os resultados de ambos também produzem resultados opostos nas áreas sociológicas, governamentais e, especificamente, legais (MANIFESTO HUMANISTA). Por isso não é problema para o Sr. Presidente quebrar TODAS as leis eleitorais; falar em ética, mas mentir acerca de tudo; de discursar para “eliminar” a oposição, como se já vivêssemos numa petecracia; de quebrar toda liturgia que o cargo lhe confere; de se referir aos adversários políticos como “esse sujeito” ou “esse cidadão”; de mudar a verdade em mentira e transformar a mentira num método. Para ele não há referenciais absolutos, a não ser o Partido, para quem todos os meios são válidos (mentiras, campanhas difamatórias como já estão ocorrendo no Recife, dizendo que Serra vai acabara a “bolsa família”, vai privatizar TODO bem público etc).
18. Não mais me estenderei sobre os textos dos amigos. Acredito que já foi, para mim, o suficiente para perceber que vocês estão eivados de pressupostos contrários à fé reformada; em termos políticos, claro. Ambos são engodados pela falácia “público-privado”; um está com a cabeça cheia do historicismo-materialista, e tão impregnado como a distinção acima, que nem percebe que tomou o nome de Deus em vão por diversas vezes, misturando os dois campos (é o que Van Til chama de “tensão entre o racional e o irracional”). O outro não observou que escolher entre um não-cristão experiente e um cristão não-experiente, confundindo a doutrina da vocação geral dos homens (a graça comum), acredita que os TODOS os pastores estão ensinando aos crentes a votarem em crentes; e que, ao orientar aos “líderes evangélicos” a não manipularem suas ovelhas, acaba incorrendo no mesmo erro, visto tentar eles mesmo manipular os manipuladores.
Termino citando Kuyper novamente (idem, p. 91. grifos meus):
Posso adicionar que a escolha popular é bem sucedida, naturalmente, onde nenhum outro governo existe, ou onde o governo existente se enfraquece. Onde quer que novos Estados tem sido instituídos, exceto pela conquista ou pela força, o primeiro governo [NA – a democracia] sempre tem sido instituído pela escolha popular; e assim também onde a mais alta autoridade tem caído em desordem, quer pelo desejo de uma fixação do direito de sucessão, quer através de revolução violenta, sempre tem sido o povo que, através de seus representantes, reivindicou o direito de restaurá-lo. Mas com igual resolução, Calvino afirma que Deus tem o poder soberano no modo de administração de sua providência, para tirar de um povo esta condição mais desejável, ou nunca concedê-la absolutamente quando uma nação é inapta para ele, ou, por seu pecado tem sido completamente privada da bênção.
Em Jesus Cristo, que está acima de César,
Gaspar de Souza
3 comentários:
Eu diria que o Texto que está no blog o tempora o mores é uma introdução ao teu texto, Gaspar. E o teu texto é uma introdução ao pensamento reformado sobre política. Parabéns pela disposição e coragem! Que Deus levante mais pessoas engajadas na sua obra para falar sobre o assunto.
Abraços,
Ronaldo
Caro Gaspar de Souza, parabéns pelo texto muito bem escrito.
Consegue responder às duas acusações mais recorrentes do momento: o chamado "reducionismo evangélico", que só discutiria questões de interesse apenas religioso (aborto e casamento gay) e a questão da "manipulação dos pastores", que estariam confundindo as esferas de sua atuação quando orientam suas igrejas em questões partidárias ou políticas.
Ainda, seguindo o comentário de Ronaldo Barboza de Vasconcelos, vejo que o que se deu início agora deve ter continuidade. Explico: creio que nunca se produziu tantas exposições do pensamento calvinista político brasileiro como agora. Não podemos deixar isso ser um afã do momento. É preciso que se reúna dos blogs calvinistas tudo o que foi produzido para que possamos começar a ter, de fato, um referêncial para a Igreja Brasileira! Minha sugestão: deve-se reunir esse material para publicação em livro. São reflexões históricas que surgiram das necessidades de se dar resposta às indagações e angústias de uma igreja ainda púbere como é a Igreja Evangélica no Brasil. Uma Igreja que, como foi muito bem demonstrado pelo seu artigo, está eivada por posições políticas e ideológicas contrárias às Sagaradas Escrituras.
Parabéns, mais uma vez, pelo texto. Siga em frente para a glória de Deus.
Gaspar parabéns pelo texto, está excelente e completo. Vou fazer comentários em partes.
Achei formidável a interpretação feita sobre o livro do profeta Amós e a situação que vivia Israel naquele momento. Nos ensina que não podemos julgar um governo pelo progresso econômico mas sim pela sua fidelidade para com Deus.
Abraço!
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