Uma carta escrita pelo governador Arnold Schwarzenegger aos membros da Assembléia do Estado da Califórnia causou furor porque, talvez, por mera coincidência, as letras de cada frase, em sete linhas consecutivas ao longo da margem esquerda, formam o acrônimo “Fuckyou”.
Eis o texto, que relata as queixas de um governador cansado de leis inócuas, votadas para atender interesses menores, enquanto as que realmente importam são relegadas ao esquecimento. Nada de se estranhar nessas práticas tão familiares a quem acompanha a política brasileira.
Aos membros da Assembléia do Estado da Califórnia:
Estou devolvendo, vetada, a Lei da Assembléia nº 1176.
Durante algum tempo, lamentei o fato de assuntos importantes serem negligenciados, enquanto muitas leis desnecessárias são trazidas à minha consideração.
As reformas do sistema de águas e das prisões, o tratamento de saúde, são assuntos cruciais que minha administração apresentou para votação, mas os legisladores simplesmente as ignoraram.
Mais uma vez, outro ano legislativo começa e termina sem que se aprovem as grandes reformas que os cidadãos californianos indiscutivelmente merecem.
Em vista disso, e após cuidadosa ponderação, eu acredito ser desnecessário sancionar essa lei desta vez.
Sinceramente,
Arnold Schwarzenegger
Soa familiar a justíssima reação do governador, sob o peso de sua impotência diante de comportamentos tão antiquados quanto atuais. A identificação com o eleitor brasileiro consciente é imediata; vive-se no Brasil uma situação que até a Kafka causaria espanto.
Um presidente defende malfeitorias, imiscui-se com desassombro nos outros Poderes, insurge-se contra órgãos fiscalizadores, defensores do bem comum contra a sanha interesseira dos que se encastelam no Estado.
Dinheiro público financia impunes atos de vandalismo, a campanha eleitoral corre escancarada sob as barbas da Justiça, o presidente do Supremo Tribunal Federal prega no deserto contra o financiamento público para invasores de terras, ao invocar a lei que manda, se obedecida fosse, suspender a concessão de verbas a verdadeiros criminosos sob o olhar complacente das autoridades, desta feita obrigadas a uma envergonhada reprovação.
Ao invés de enrijecer, abrandam-se leis eleitorais, afrouxam-se mecanismos de controle, transige-se o tempo todo com “parceiros” comerciais como os argentinos, arma-se uma enorme celeuma a respeito do uso de bases colombianas por americanos, compram-se mal-afamados aviões franceses para não ceder ao infantilismo antiamericano.
Nem a fertilíssima imaginação do autor de O processo vislumbraria tal inversão de valores, Comissões Parlamentares de Inquérito invariavelmente controladas pelos partidários dos investigados, no Rio Grande do Sul, inclusive.
Tanto para Schwarzenegger, como para os personagens de O processo e os cidadãos comuns brasileiros, a sensação de surrealismo chega a ser tangível.
Fonte: Opinião e Notícia
Postado por Gaspar de Souza
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