quinta-feira, 2 de julho de 2015

A FILOSOFIA DE GÊNERO

Dr. Douglas Groothuis
Traduzido e publicado com permissão do autor
Tradutor: Gaspar de Souza

Ideias têm consequências, mas poucos entendem como as consequências estão enraizadas em e fluem das ideias. O assunto de casamento de mesmo sexo e gênero não pode ser entendido sem uma análise filosófica. A decisão da Suprema Corte de que a proibição do casamento homossexual é contra A Constituição é jurisprudência patética, mas sob dessa cosmovisão estão pressupostos que deveriam ser expostos à luz da razão.

Gênero agora é considerado um conceito flexível; não é mais dado pela natureza de alguém. A Biologia agora não tem mais a fazer com o gênero. Em vez disso, toma-se um gênero de alguém por identificá-lo com uma vasta gama de possibilidades. A natureza do organismo humano – sob o DNA – é irrelevante para identidade de gênero.  A tradição da raça humana de que macho e fêmea são categorias fixas e perpétuas de seres nada significa para os experimentalistas de gênero. Homens podem identificar-se com mulheres (e, talvez, ter uma operação de mudança de sexo); mulheres podem identificar-se com homens (e, talvez, ter uma operação de mudança de sexo); homens podem identificar-se bissexuais; mulheres podem identificar-se como bissexuais. Macho e fêmea podem identificar-se como parcialmente heterossexuais e parcialmente homossexuais.

Como essa redefinição de identidade humana aconteceu? Antes de tentarmos responder a isso, considere a metafísica do movimento em relação ao Teísmo Cristão, uma cosmovisão cada vez mais rejeitada pelos agentes do poder da cultura America.

Cristãos, juntamente com Judeus, sabem que o universo tem um significado intrínseco dado por um Deus infinito e pessoal, o Criador e Projetista do universo. Este ser, que pensa, fala e age, trouxe os humanos à existência como seus representantes; como tal, eles possuem racionalidade, vontade, emoções e relacionamentos. Como o primeiro livro da Bíblia ensina:

E criou Deus o homem à sua imagem; à imagem de Deus o criou; homem e mulher os criou. E Deus os abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e sujeitai-a; e dominai sobre os peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre a terra.  (Gênesis 1. 27, 28)

Esta declaração é filosoficamente rica de significado. Os humanos têm uma natureza dada por Deus, uma constituição como macho e fêmea. Isto é um dado divinamente outorgado. Isto é, os humanos são uma espécie especial de ser, como é o resto da criação viva. Antes da criação dos humanos, Gênesis registra que:

E disse Deus: Produza a terra alma vivente conforme a sua espécie; gado, e répteis e feras da terra conforme a sua espécie; e assim foi. E fez Deus as feras da terra conforme a sua espécie, e o gado conforme a sua espécie, e todo o réptil da terra conforme a sua espécie; e viu Deus que era bom (Gênesis 1. 24, 25. Grifos do autor).

A palavra espécie não deveria ser tomada de maneira biologicamente precisa; em vez disso, ela fala de uma forma distinta de ser, uma essência. Deus não criou o cosmos e os humanos de uma maneira de valor-neutro. Pelo contrário, o significado e a função apropriada das entidades vivas são especificados por seu criador e exaurido em seu próprio ser. Nossos primeiros pais rejeitaram a ordem e mandamento de Deus fora motivadas pelo desejo de redefinir a realidade independente de Deus. A rejeição da palavra de Deus sobre os termos de Deus resultou na Queda, cujos efeitos foram sentidos através das eras (Gênesis 3). Movendo-se desde a Criação até a Ressurreição, o Apóstolo Paulo afirma categorias objetivamente reais da realidade – viva e não-viva – em seu grande discurso sobre a ressurreição de Cristo e dos Discípulos de Cristo.

Nem toda a carne é uma mesma carne, mas uma é a carne dos homens, e outra a carne dos animais, e outra a dos peixes e outra a das aves. E há corpos celestes e corpos terrestres, mas uma é a glória dos celestes e outra a dos terrestres. Uma é a glória do sol, e outra a glória da lua, e outra a glória das estrelas; porque uma estrela difere em glória de outra estrela.(1 Coríntios 15.39 – 41)

Não é preciso aprofundar maiores detalhes no argumento para perceber que ele ensina que Deus tem especificado a natureza das coisas. Sendo assim, as criaturas deveriam acatar as instruções do Criador no modo como elas vivem suas vidas mortais neste planeta.

Jesus ensinava e pensava dentro dessa cosmovisão. Quando perguntaram-lhe sobre casamento e divórcio, ele apelou para a natureza dos homens e mulheres:

Então chegaram ao pé dele os fariseus, tentando-o, e dizendo-lhe: É lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo? Ele, porém, respondendo, disse-lhes: Não tendes lido que aquele que os fez no princípio macho e fêmea os fez, e disse: Portanto, deixará o homem pai e mãe, e se unirá a sua mulher, e serão dois numa só carne? Assim não são mais dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem.(Mateus 19. 3 – 6)

Quando alguém rejeita a existência de Deus (ou simplesmente a ignora), ele não está simplesmente rejeitando uma ideia filosófica ou religiosa. Ele está rejeitando todas as ideias e práticas que são singularmente apoiadas pelo Teísmo Cristão. Friedrich Nietzsche (1844 – 1900) entendeu muito bem isto. Em sua famosa parábola “O Louco”(em Gaia Ciência), Nietzsche deixa seu profeta falar das implicações da “morte de Deus”

Como nos consolar, a nós, assassinos entre os assassinos? O mais forte e mais sagrado que o mundo até então possuíra sangrou inteiro sob os nossos punhais – quem nos limpará este sangue? Com que água poderíamos nos lavar? Que ritos expiatórios, que jogos sagrados teremos de inventar? A grandeza desse ato não é demasiado grande para nós? Não deveríamos nós mesmos nos tornar deuses, para ao menos parecer dignos dele? Nunca houve um ato maior – e quem vier depois de nós pertencerá, por causa desse ato, a uma história mais elevada que toda a história até então!” nesse momento silenciou o homem louco, e novamente olhou para seus ouvintes: também eles ficaram em silêncio, olhando espantados para ele. “Eu venho cedo demais”, disse então, “não é ainda meu tempo. Esse acontecimento enorme está a caminho, ainda anda: não chegou ainda aos ouvidos dos homens. O corisco e o trovão precisam de tempo, a luz das estrelas precisa de tempos, os atos, mesmo depois de feitos, precisam de tempo para serem vistos e ouvidos. Esse ato ainda lhes é mais distante que a mais longínqua constelação - e no entanto eles o cometeram!"[1]

Sim, “e no entanto eles o cometeram!” por banir Deus de seus pensamentos, suas vidas e suas culturas. Deus está morto para o ímpio, mas permanece obstinadamente vivo como Criador e Juiz. O Psicólogo Eric Fromm (1900 – 1980) escreveu que no século dezenove Deus morreu. No século vinte o homem morreu. Se o homem não foi criado por Deus, por que deveria se importar muito com ele? A colheita amarga foi a dezenas de milhões assassinados pelo Nazismo e Comunismo. No século vinte e um o gênero morreu, desde que o homem não concedeu a natureza por Deus. O gênero agora é desequilibrado da biologia, história, lógica e religião. Ele é flexível, fungível, maleável e infinitamente inconstante, uma vez que não precisa obedecer a nada objetivamente real. A discussão de gênero está em toda a parte; [mas] o fato do gênero não está em lugar nenhum, desde que os fatos fazem muitas exigências sobre as mentes livres.

Francis Schaeffer (1912 – 1984), filósofo e crítico social, discerniu esta ruptura da realidade dada de Deus em 1968 em sua obra de referência, O Deus que Intervém:

Algumas formas de homossexualismo de hoje são de natureza tal que não se limitam ao homossexualismo somente, mas representam uma forma de expressão filosófica. Precisamos ter compreensão para com o real problema da homofilia. Mas grande parte da homossexualidade moderna é expressão da atual negação da lei da antítese. Neste caso, isso levou à negação da distinção entre homem e mulher. De modo que se extinguiu a ideia de macho e fêmea, visto como parceiros complementares [...] Para grande parte do pensamento moderno, a ordem do dia é combater todas as antíteses e toda a lógica da criação divina – inclusive a distinção macho e fêmea.[2]

Schaeffer viu a origem do problema: as pessoas estavam negando a antítese real entre verdade e falsidade, entre bem e mal, entre o que Deus criou e o que o homem corrompeu. Mas mesmo Schaeffer – profeta que foi – não poderia ter visto a extensão em que a realidade seria negada em nome do amor, tolerância, escolha e liberdade.

Vamos tentar trazer tudo isso junto. A filosofia que sustenta e anima esta redefinição de gênero é anti-essencialista e construtivista. Os humanos como macho e fêmea não têm uma natureza objetiva, qua gênero. Gênero é apenas um espaço reservado para a vontade do identificador, que escolhe o gênero não com base qualquer coisa estável ou confiável, mas apenas pela excentricidade erótica. Alguém constrói uma identidade de gênero, mas sem o auxílio de um modelo. O que se constrói, pode ser destruído – caprichosamente sem fim. E agora essa filosofia é apoiada a toda força por lei federal. Se você discorda, você será punido. Tratarei disso num ensaio posterior.

Muito mais precisa ser articulado sobre essa nova corajosa revolução de gênero. Por enquanto, compreenda a cosmovisão – ideias têm consequências e ideias falsas têm más consequências. Basta olhar em sua volta.





[1] NIETZSCHE, Friedrich. A Gaia Ciência. São Paulo: Companhia das Letras, 2001, § 125 (N.T)

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