[Luiz Carlos] Prestes estava mais
uma vez convencido de que a estratégia que ele mesmo traçara para o partido
levá-lo-ia, brevemente, ao poder.
O PCB e as organizações sindicais
dominadas pelo partido ou por ele infiltradas haviam apoiado a campanha do
plebiscito com um programa mínimo que consubstanciava as tradicionais bandeiras
do partido: a legalidade, a reforma agrária radical, a nacionalização de
empresas estrangeiras, o rompimento com o FMI, a revogação da Lei de Segurança
Nacional.
As tentativas revolucionárias de inspiração
cubana em vários países da América Latina – contrárias à linha política do PCB –,
iniciadas na década de 1960 em Honduras, Guatemala, Nicarágua, Venezuela, Peru,
Colômbia, Argentina e Equador, se haviam esgotado no nascedouro ou estavam
derrotados no final de 1963.
Julião desaparecera. Ao candidatar-se a uma vaga de
deputado pelo PSB de Pernambuco, desviara meios e recursos das ligas camponesas
para sua campanha, entrando em choque com Morais, que comandava o setor armado
Morais. Morais exigiu que ele devolvesse os veículos desviados, colocasse as sobras de campanha à disposição da
luta guerrilheira e dissolvesse o Movimento Tiradentes. Decidiu tomar à mão armada
o jornal semanal A Liga, que
sob a direção do jornalista Jânio de Freitas, seu editor, transformara-se em um
órgão a serviço de interesses de intelectuais, como o jornalista e sociólogo Luciano Martins,
o advogado Afrânio Araújo, o sociólogo Wanderley
Guilherme dos
Santos, o advogado Carlos Franklin Paixão de Araújo e o poeta
Ferreira Gullar, entre outros.
As ligas camponesas tinham sido praticamente extintas
quando o PCB e a Igreja Católica fundaram a Confederação Nacional dos Trabalhadores
na Agricultura, em dezembro de 1963. Assumiu a presidência da CONTAG o
pecebista Lyndolfo Silva, que a filiou ao CGT.
Quase todos os empecilhos para a vitória da linha
política do partido estavam praticamente afastados.
Em janeiro de 1964. Prestes parte para Moscou, aonde vai
prestar contas dos resultados obtidos nos dois últimos anos de trabalho do PCB,
desenvolvido à luz da estratégia traçada por ele e por Kruschev em novembro de 1961.
Reúne-se com os principais detentores do poder na URSS:
além do próprio Kruschev e de seu ideólogo Mikhail Suslov, Leonid Brejnev e Iuri Andropov,
secretários do Comitê Central do Partido, e Bóris Ponomariov. Chefe do
Departamento de Relações Internacionais. Nessa ocasião, pinta o seguinte quadro
da situação brasileira, enfatizando os seguintes pontos:
"A escalada pacífica dos comunistas no Brasil para o
poder abrindo a possibilidade de um
novo caminho para a América Latina.
Um poderoso movimento de massas sustentado pelo poder central
e tendo no seu núcleo um dos partidos
comunistas mais sólidos do continente encontra-se instalado no seio do
aparato estatal.
Um exército penetrado
dos pés à cabeça por um forte
movimento nacionalista e antiimperialista
A tomada do controle do estado
burguês de seu interior para fora.
Oficiais nacionalistas e comunistas
dispostos a garantir pela força, se necessário, um governo nacionalista e antiimperialista.
Depois prossegue:
A
luta pelas reformas de base constitui um meio para acelerar a acumalação de forças eaproximar a realização de objetivos revolucionários;
A
premissa básica para a realização das reformas de base será a instalaçã de um
governo nacionalista e democrático, uma vez que somente um governo desse tipo terá condições para começar a
levá-las à prática, induzindo o País por um novo curso
de desenvolvimento econômico e político.
O arcabouço institucional impede as reformas, pois e/as dependem de dois terços do
Congresso, tornando-as irrealizáveis,
dado que ele é majoritariamente anti-reformas
O grande trunfo será o dispositivo militar, capaz não só de barrar um golpe ou uma
reação da direita, mas, por uma ação enérgica e com o apoio das massas desencadear o processo de reformas.
A exemplo de
1935, a revolução deveria começar, novamente, pelos quartéis.
Implantaremos um capitalismo de
Estado, nacional e progressista, que será a ante-sala do socialismo.
Conclui o seu relatório afirmando a intenção de,
"uma vez a cavaleiro do aparelho do Estado, converter rapidamente, a exemplo da Cuba de Fidel, ou do Egito de Nasser, a revolução nacional-democrática em socialista" (os grifos
são nossos).
A estratégia descrita por Prestes ajustava-se
perfeitamente à política de coexistência pacífica da URSS. Não envolveria
diretamente a grande potência comunista no conflito e evitaria um confronto com
os EUA, de nenhum modo desejado depois da crise dos mísseis em Cuba. Ao mesmo
tempo, no âmbito da disputa pela hegemonia do movimento comunista
internacional, serviria como resposta às críticas chinesas à política soviética
da coexistência pacífica.
A URSS não só concordou com a
estratégia descrita por Prestes como “comprometeu-se novamente com qualquer
tipo de auxílio, do político ao militar”.
Fonte: AUGUSTO,
Agnaldo Del Nero. A Grande Mentira.
Rio de Janeiro, RJ: Biblioteca do Exército Editora, 2001, p.121, 122.
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