quarta-feira, 27 de março de 2013

O Argumento Ontológico de Norman Malcolm


Por C. Stephen Evans[1]

Este é um trecho do livro Philosophy of Religion de C. Stephen Evans, no capítulo que trata dos Argumentos Clássicos para Existência de Deus. Neste excerto, Evans descreve a formulação de Norman Malcolm segundo o Argumento Ontológico de Anselmo, em que trata com o conceito de existência necessária.

Os Argumentos Ontológicos tentam mostrar que o próprio conceito ou ideia de Deus implica sua realidade. Se uma pessoa pode claramente conceber Deus, então ele ou ela deve ser capaz de entender que Deus deve existir. Os créditos para a primeira formulação deste argumento são, geralmente, atribuídos a Santo Anselmo, Arcebispo da Cantuária no século onze. Várias versões do argumento têm sido defendidas por filósofos famosos como Descartes e Leibniz. O século vinte tem visto um grande reavivamento de interesse no argumento, como pensadores tais como Charles Harstshorne, Norman Malcolm e Alvin Plantinga defendem-no.

A versão original de Anselmo é desenvolvida em seu Proslógio no curso de algumas reflexões sobre o que o “tolo diz em seu coração: não há Deus”. Anselmo raciocina que até mesmo em negar a existência de Deus, o tolo deve entender a ideia de Deus. Deus deve existir ao menos como uma ideia no entendimento do tolo. Qual é a ideia de Deus? Para Anselmo, Deus é o maior ser possível, “um ser do qual não é possível pensar nada maior” 

Anselmo afirma que é melhor ou maior existir na realidade do que simplesmente existir no entendimento. Desde que Deus é, por definição, o maior ser possível, diz Anselmo, é impossível para Deus existir apenas no entendimento do tolo. Pois, neste caso, um ser maior do que Deus poderia ser facilmente concebido, ou seja, um ser que existe tanto no entendimento quanto na realidade. Posto em passos numerados, o argumento é como se segue:

1. Deus é o maior ser possível.

2. Deus existe ao menos na mente ou no entendimento.

3. Um ser que existe apenas na mente não é tão grande quanto um ser que existe na realidade bem como na mente.

4. Se Deus existe apenas na mente, ele não seria o maior ser possível.

5. Então, Deus deve existir na realidade e também na mente.

Como era de se esperar, este argumento tem encontrado muitas objeções, pois a afirmação de que a existência de alguma coisa pode ser inferida simplesmente de sua definição é implausível para muitas pessoas. Gaunilo, um contemporâneo de Anselmo, produziu uma paródia do argumento em que ele tentava provar que uma Ilha Perfeita – “um ilha da qual nenhuma maior pode ser concebido” – deve existir. A réplica de Anselmo a este foi essencialmente que o conceito de Deus é único. Deus, diferente das ilhas e outros objetos finitos, é um ser necessário. A implicação é que o conceito de “uma possível ilha maior ou mais perfeita” não pode ser coerente. Talvez para algumas [ilhas] que nós concebamos, poderiam ser concebida uma mais perfeita do que ela. Mas, apenas um ser necessário pode ser um maior ser possível. A importância da réplica de Anselmo será evidente abaixo.

Uma objeção famosa feita por Kant e outros é que não se pode legitimamente pensar “existência” como uma propriedade que uma entidade pode ou não pode ter em graus variados. Dizer de algo que ele existe não é dizer que ele tem alguma propriedade como “ser vermelho”, mas que a entidade em questão, com todas as suas propriedades, tem sido atualizada. Quando nós pensamos de um objeto, nós sempre implicitamente pensamos dele como existindo. Mas, se existência não é uma propriedade, então ela não pode ser uma propriedade que acrescentamos à grandeza de Deus, o qual é requerido pelo argumento. O debate se existência é uma propriedade (ou se “existe” é uma predicado adequado) não é um que podemos resolver, embora pareça seguro afirmar que existência não é uma propriedade ordinária.

Outra objeção popular é a afirmação de que o Argumento de Anselmo fala-nos apenas sobre a definição de Deus; ele não pode dizer-nos algo que satisfaça aquela definição. Anselmo nos diz, muito corretamente, que quando pensamos em Deus, pensamos Nele como um ser real, mesmo como um ser necessariamente real, um ser que não pode deixar de existir. Essa definição, no entanto, como todas as definições, apenas nos diz o que Deus seria se ele existisse. [Mas] ele não pode estabelecer o fato de que ele existe.

Versões contemporâneas do Argumento [Ontológico] têm concentrado no conceito de existência necessária, a que Anselmo empregou em sua réplica a Guanilo e no capítulo três de seu Proslógio. Alguns filósofos, como o Normam Malcolm, têm argumentado que, realmente, Anselmo desenvolveu dois argumentos.

O primeiro argumento enfatiza a existência como uma “propriedade de condição necessária”, a qual Malcolm pensa ser falacioso, desde que existência não uma propriedade. O segundo postulou o conceito de existência necessária.

A essência do segundo argumento, como Malcolm formula, é como se segue: Deus é, por definição, um ser que simplesmente não passou a existir. Deus não pode vir à existência, nem pode ficar fora da existência, uma vez que um ser que o fizesse um ou outro não seria Deus. Segue-se disto que se Deus existe, então sua existência é necessária. Se ele não existe, então sua existência é impossível. Mas, ou Deus existe ou não existe, então, a existência de Deus é necessária ou impossível. Uma vez que não parece plausível dizer que a existência de Deus é impossível, segue-se que sua existência é necessária. Assim, se a existência de Deus é possível, então é necessária.  Abaixo segue o argumento. Mais formalmente, o argumento pode ser posto como se segue:

1. Se Deus existe, sua existência é necessária;

2. Se Deus não existe, sua existência é impossível.

3. Ou Deus existe ou ele não existe.

4. A existência de Deus é necessária ou impossível.

5. A existência de Deus é possível (não é impossível)

6. Então, a existência de Deus é necessária.

Como deveríamos avaliar este argumento? Ele é formalmente válido? Certamente parece ser. Mas, é legítimo? Para ser legítimo, as premissas devem ser verdadeiras. Das cinco premissas a mais problemática é a número (5)

Como nós sabemos que a existência de Deus é realmente possível? A premissa parece bastante inócua; parece como se nós estivéssemos simplesmente dizendo que talvez exista um Deus. Ela se torna uma afirmação bastante poderosa, no entanto, uma vez que a existência de Deus só é possível se ela for necessária. Por que o ateísta não deveria rejeitar e afirmar a existência de Deus, quando o assunto é completamente compreendido, pode ser visto como impossível? Uma vez que Deus não existe, não é possível que ele já tenha existido ou nunca existirá.

Por outro lado, qualquer que creia que Deus realmente exista terá que julgar que esta premissa é verdadeira e, deste modo, o argumento será legítimo. Pois a possibilidade da existência de Deus certamente segue-se da realidade de sua existência. É claro que devemos lembrar que uma prova eficaz deve ser mais do que simplesmente legítima. Ela deve ser racionalmente convincente. Aqui o argumento parece falhar, pois é difícil ver porque um ateísta não rejeitaria a premissa (5) e firmemente manter a impossibilidade da existência de Deus. E mesmo que o ateísta julgue a legitimidade do argumento e, portanto, será para ele convincente, não será racionalmente convincente ou a menos que possa, de alguma forma, saber que a existência de Deus é possível sem inferi-la de sua existência real. Devemos lembrar que, para um argumento ser racionalmente convincente para alguém, as premissas devem ser conhecidas a essa pessoa por razões independentes da conclusão.

Mesmo se o argumento falhe como uma prova racional convincente, no entanto, ele ainda pode realizar outras tarefas. Alvin Plantinga, um defensor de uma versão contemporânea do Argumento Ontológico, afirma que, embora o argumento possa não ser uma prova, ele demonstra que é razoável crer em Deus. A premissa central, que a existência de Deus é possível, embora possa não ser conhecida, é uma proposição que poderia ser racionalmente aceita: o argumento mostra a “aceitabilidade racional” do teísmo[2]. Isto parece legítimo, mas deveria ser observado que o ateísta pode, talvez, fazer uma afirmação semelhante: não é claramente contrário à razão afirmar que a existência de Deus é impossível.

Karl Barth interpreta o argumento de Anselmo não como uma prova, mas como uma tentativa de entender mais profundamente o que é aceito pela fé. Parece plausível que o propósito de Anselmo em formular este argumento pode ser bem diferente dos propósitos dos filósofos contemporâneo que têm defendido o argumento. Em todo caso, independente do valor o Argumento Ontológico como prova, reflexões sobre ele aprofundam nossa apreciação de Deus como um ser necessário.

O argumento também serve a função de forçar o ateísta a “sair do esconderijo”. Se o argumento é válido, então a pessoa que deseja negar que Deus existe, deve afirmar que a existência de Deus é impossível. Esta é uma afirmação muito mais forte que uma pessoa queira fazê-la inicialmente. Este último ponto pode ser generalizado em uma moral que possa ser aplicada a todos os argumentos teístas. Os Argumentos podem ser rejeitados, mas a pessoa que os rejeita paga um alto preço. Pois negar uma proposição é logicamente equivalente afirmar outra proposição. Negar p é afirma não-p. Em alguns casos, a asserção necessária para rejeitar os argumentos teístas pode ser mais problemáticas que outras.

Traduzido por Gaspar de Souza


[1] EVANS, C. Stephen. Philosophy of Religion: Thinking About Faith. Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1982, p. 46 – 50.
[2] Consulte PLANTINGA, Alvin. Deus, a Liberdade e o Mal. São Paulo: Vida Nova, 2012, p.140 [N.T]


Um comentário:

Anônimo disse...

Quando o ser humano fala essa caneta e perfeita,esse copo e perfeito ele esta dividindo a perfeição,a perfeição e unica,o ser humano divide a perfeição por que ele esta na imperfeição,a perfeição não pode estar na imperfeição,quando o ser humano tem uma ideia de deus como sendo perfeito,e impossivel o ser humano provar a existencia de deus na imperfeição,se o ser humano tem uma ideia de deus como o mais perfeito se ele não existe na imperfeição,então ele existe na perfeição,então deus existe